Curioso o fato de Saint-Germain, que se dizia
conde, ter nascido na Transilvânia. Assim como Drácula, nunca foi visto comendo
ou bebendo e também era imortal, com a diferença de que a personagem de Bram Stocker
somente foi morta depois de muito trabalho, enquanto Saint-Germain teria
morrido oficialmente em 1784.
Após o convento de Wilhemsbad, muitos daqueles
senhores que desfrutavam de títulos nobiliárquicos aderiram aos Illuminati,
incluindo Saint-Germain, Cagliostro e Ferdinand, duque de Brunswick - o grande
chefe da maçonaria europeia, já devidamente templária e orgulhosa dos seus
graus superiores que a tornavam “escocesa”. Com a lenda de Hiram – que refletia
a morte de Jacques de Molay – e toda uma tradição a revesti-la, a maçonaria ressurgia
como uma extensão do Judaísmo, bem mais atraente que a simplicidade estóica do
Cristianismo.
Também por isso, os maçons construiram belos
lugares de encontro e iniciação à imagem do templo de Salomão (que deveria ser
chamado Templo de Davi, porque, afinal, foi o pai de Salomão quem recebeu o
modelo da construção do próprio deus judeu) e deixaram de se reunir em tavernas
como “O Ganso e a Grelha” ou “O Bode”, que não primavam pelo simbolismo em seus
nomes. Talvez “O Bode”, lembrando a figura hierática do Baphometh, mas,
sinceramente, “O Ganso e a Grelha”...
A exemplo das cidades-estado da Grécia e de
Roma, quando os reis foram substituídos pela aristocracia, perdendo o poder de
reger e ficando limitados aos cultos sacros, considerou-se muito moderno
durante o período do Iluminismo destituir-se a monarquia do seu despotismo
feudal e entregar os reinos para os seus verdadeiros donos que, naturalmente,
formavam a classe dos muito ricos e eram apelidados de burgueses porque se
originaram nos burgos, lugarejos que cercavam mosteiros e castelos medievais e,
posteriormente, se transformaram em cidades.
Não havia interesse em derrubar os monarcas,
mas torná-los obedientes servos bem remunerados para, em dias e horas aprazadas,
abanarem para o povo, que veria neles o reflexo de Deus na Terra e se sentiria
agradecido por tão augusta proteção. Chegara o momento de tornar os déspotas
tradicionais esclarecidos com a luz da razão, passando a outros déspotas sem
coroa o pastoreio dos povos - déspotas muito simpáticos que avisavam aos
trabalhadores que continuariam trabalhando como escravos, muitas vezes fazendo
bolos quanto faltasse pão; no entanto, agora tinham direitos humanos, muito
humanos.
No século das luzes, o capitalismo surgia como
o novo grande déspota e as massas, que ainda não se sabiam massas, estavam
extasiadas pela sucessão das brilhantes descobertas e a maior de todas – a
utilização da eletricidade – ainda restrita à pesquisa nas oficinas maçônicas e
conventos jesuítas - decifrava os códigos de Deus e prometia séculos vindouros
de imenso glamour.
Durante a Revolução Francesa matava-se. Não
era a ideia inicial, quando se pretendia apenas o apoio de Luís XVI para a
reforma social que elevaria burgueses a barões do reino, mas que fazer com um
rei que adorava brincar de ferralheiro e com uma rainha estrangeira sujeita a
sucessivos escândalos?
Além disso, o povo enraivecido, os sans-cullote que acreditavam fazer a revolução assaltando castelos e a Bastilha, símbolo do
feudalismo que se extinguia e onde estavam dois ou três prisioneiros, incluindo
o Marquês de Sade, exigia cabeças, deliciando-se com o espetáculo da
guilhotina. Acreditava o povo que logo após a mortandade de clérigos, nobres e
monarquistas lhe seria dada a prometida Igualdade, a ansiada Fraternidade e a
desconhecida Liberdade. Deram-lhe um falso imperador, inúmeras batalhas e o
papel de bobo da História que era urdida nos bastidores.
Entre os Illuminati, Goethe usava o pseudônimo
de Abaris, Mirabeau o de Leonidas e Adam Weishaupt o de Spartacus.
Cada Illuminati tinha o seu pseudônimo ou nome esotérico, hábito que se
estendeu para a maçonaria e demais organizações que se imaginavam muito
secretas e em contato com o invisível que, obrigatoriamente, deveria ser mais
sábio que o visível e cedo ou tarde passaria grandes revelações aos “homens de
desejo”, conforme denominava Saint-Martin àqueles que liam os seus escritos -
que não eram seus, mas ditados pelos Superiores Desconhecidos. Os martinistas,
ao contrário dos maçons, acreditavam na iniciação individual e em práticas
mágicas que levariam, cedo ou tarde, a um contato mais concreto com a Coisa (le
Chose) ou “Restaurador”.
A verdadeira restauração aconteceu com o
reinado de Luís XVIII, em abril de 1814 - o faceiro rei resignado às demais
potências europeias, após a traição de Grouchy em Waterloo. Mas, antes de todas
as batalhas, quando a república da guilhotina era um autêntico reflexo da
deslumbrada era da razão, os templários maçons caçaram martinistas cristãos,
que se viram obrigados a fugir para a Suíça e outros cantões, levando consigo o
que restou dos cadernos iniciáticos de Saint-Martin. Voltaram quando o século
da luzes se apagava em sangue coagulado e muito havia o que fazer para enterrar
os mortos e invocar os recalcitrantes espíritos.
Definiam-se duas vertentes dentro do
ocultismo. Martinistas e rosacruzes continuadores dos ensinamentos de Pasqualy
- o mestre que teria ou não morrido em São Domingos - buscavam a “verdade”
através do misticismo. Praticavam artes mágicas que incluíam círculos onde o
operador ficava com a sua espada desembainhada a afastar maus espíritos e
conjurando os bons que tinham nomes que terminavam, inevitavelmente, com o
sufixo “el”; mantras eram entoados; riscavam-se pantáculos que se pareciam
muito com os desenhos que os pretos velhos fazem nas terreiras e que teriam sua
origem nas descobertas do iniciado Salomão, provavelmente quando se interessou
por cabalas outras, desobedecendo a Jeová e do seu reino foram-lhe tiradas dez
tribos. A magia virou uma obsessão e tantas eram as práticas que se eu fosse
contar não poderia e não saberia, porque eram muito, muito secretas.
Por seu lado, os maçons – devidamente
infiltrados pelos Illuminati, prováveis jesuítas disfarçados de iluministas –
não desdenhavam nenhuma das cores da magia e a ela agregavam a ciência material,
que prometia grandes ganhos a prazo ainda indeterminado e transformava os magos
da razão em semideuses, quem sabe verdadeiros deuses que criavam o seu
arquétipo em um Grande Arquiteto Universal, o perfeito Geômetra que usa a newtoniana
régua e o compasso da Gnosis para desvelar, somente para os iniciados, o poder
Gerador do capital.
Em sua misteriosa pureza-impureza tão própria
dos mercadores de todas as épocas, os maçons franceses, agora não mais ateus
depois da revolução que elevara a burguesia a casta privilegiada, a cada três
batidas do simbólico martelo da justiça lembravam o deus que tudo criara, muito
parecido com o Jeová hebraico e cuja verdadeira denominação seria esclarecida
no século XIX pelo judeu estadunidense Albert Pike, o grande Superior Conhecido
que se preparava para a reencarnação na América muito ao norte, que dizimava os
seus últimos nativos.
O nome de Deus é Adonai ou Lúcifer?,
perguntavam-se os angustiados maçons-Illuminati, e Pike, o senhor de todas as
esferas e triângulos decidiria: - Lúcifer! Adonai era o deus mau, o Demiurgo
que deveria ser combatido. Lúcifer, o anjo da luz, trazia o segredo da ciência
que daria ao povo escolhido a suprema luz nuclear e o domínio sobre a natureza
e a humanidade profana. Lúcifer e Adonai passavam a ser os deuses maçônicos.
“Sim, Lúcifer é Deus, e, portanto, Adonai também” – escreveria Pike. “Assim, a
verdadeira e pura religião filosófica é a crença em Lúcifer, assim como em
Adonai”.
Enquanto esperavam a vinda do guru
luciferiano, questões transcendentais como essa eram tratadas nas Lojas dos
Estados Unidos da América, desde que fora transferido para Charleston o centro
mundial do poder oculto, deixando os esfuziantes franceses com uma revolução
perdida e a sensação de logro presa nos milimétricos aventais.
Na França, o britânico Ramsay fizera um
discurso, afirmando que os maçons eram descendentes diretos dos templários, cavaleiros
que foram tão cruelmente derrotados por árabes e mamelucos nas antigas Cruzadas
e, mesmo assim, arrecadaram imensas riquezas em todo o continente europeu e
sabe-se mais aonde, até o momento em que um rei muito mau, chamado Filipe, o
Belo – que deveria ser feio, muito feio!... Mas era melhor lembrar que o poder
secreto dos templários, um poder muito desconhecido, somente acessível aos
grandes adeptos, era uma herança para ser ritualizada em mais 30 graus – e
nunca esquecer que Jacques de Molay, assim como Hiram Abiff, deveria ser vingado.
Em Charleston, onde passa o Paralelo 33 norte,
em 1761 o Conselho dos Imperadores do Oriente e do Ocidente outorgou uma
carta-patente para um senhor chamado Stephen Morin, constituindo-o Grande
Inspetor do Rito da Perfeição. Era a instituição do Rito Escocês Antigo e
Aceito, com 33 graus, que, embora tenha sido criado aparentemente a partir do
discurso de Ramsay, segundo o mago Leadbeater foi estabelecido primeiro nos
Estados Unidos.
Tristemente, Leadbeater afirmou – em “O Rito
Escocês Antigo e Aceito” (www.samauma.biz) - que “Stephen Morin foi também infeliz na escolha
dos seus lugares-tenentes, pois em muitos casos eram judeus de reputação não
muito boa, e é por meio dessas mãos algo sujas que temos de investigar o Rito
de Perfeição durante os quarenta anos subsequentes. O Rito atravessou um
período de obscurecimento, quando os graus eram vergonhosamente vendidos a quem
quer que comprasse os seus títulos, ao passo que o significado interno das
cerimônias foi quase esquecido”.
Narra o desencantado Leadbeater que o Rito foi
estabelecido em Charleston por Stephen Morin, mas, a partir de 1783, houve uma
sucessão de judeus, durante quarenta anos, como deputados-inspetores do Rito:
Moisés Cohen, Isac Long, Moisés Hayes, Isac da Costa... até o Rito tornar-se
perfeitamente perfeito, como cabe a um rito de perfeição, podendo, então,
passar para mãos profanas com luvas de iniciados.
Para dar maior ênfase à maçonaria “escocesa”
norte-americana que dominaria o mundo visível através de (quase) invisíveis
manobras, alegou-se que Frederico II, o
muito alegre soberano da Prússia, teria ratificado as leis que regulam o Rito
Escocês, constituindo pessoalmente o grau 33 e delegando poderes, como Soberano
da Maçonaria, a nove maçons em cada país.
No mesmo texto, Leadbeater refuta a versão
sobre Frederico II, dizendo: “(...) a
verdade é que Frederico II não tomou nenhuma parte ativa no Rito de Perfeição;
jamais ratificou a Constituição nem criou o 33º (...)”. No entanto, “(...)Em 1785, um ano antes da morte do rei,
encontramos uma carta endereçada a Frederico por um tal Salomão Bush (judeu,
com certeza), Deputado Grande-Inspetor da América do Norte, pedindo-lhe o
reconhecimento de uma Loja que ele tinha consagrado (...)”. A maçonaria
amesquinhava-se depois das revoluções francesa e estadunidense, buscando um
soberano secreto para os donos de um país que se dizia republicano e se
preparava para tonar-se imperialista, provavelmente com o apoio do combatido
Demiurgo.
Alguns anos antes da gloriosa revolução dos
franceses, o Príncipe-Eleitor, conde palatino e duque da Baviera Karl Theodor
aprovou o edito que levou os Illuminati a sua oficial dissolução em 1784,
depois da descoberta de documentos da ordem que tratavam de planos secretos para
dominar a maçonaria e destruir a Igreja Católica através dos mesmos métodos
usados pelos jesuítas. Adam Weishaupt, filho do rabino Johann Georg Weishaupt,
retirou-se para um aparente exílio em Regensbourg, passando a liderança para
Joachin Bode que, em 1787, junto com o núcleo francês, constituiu a ordem secreta
“Philadelphes”. Oficialmente, os Illuminati estavam banidos da Europa e foram
muito bem aceitos nas Lojas dos Estados Unidos.
No mesmo ano da extinção dos Iluminati – 1784
– o imortal Saint-Germain também morria em Schleswig-Holstein, propriedade do Illuminati
Karl de Hesse-Kassel; os maçons estadunidenses entravam para todas as igrejas
protestantes disponíveis, a exemplo dos maçons europeus; o Congresso dos
Estados Unidos ratificava oficialmente o Tratado de Paris de 1783 com a
Grã-Bretanha e os dois países irmãos preparavam-se para colonizar o mundo,
sendo que os mercadores dos Estados Unidos já estavam presentes nos portos da
Ásia e da África.
Em 1784, a extinção da Companhia de Jesus ainda
era válida para todo o mundo católico, menos Polônia e Rússia, onde dominava a
muito iluminada czarina Catarina. Na Prússia, o protestante Frederico II,
soberano da maçonaria, também acolhia os jesuítas expulsos dos países amigos.
Em 1784, o papa Pio VI nomeou o jesuíta John
Carrol bispo de Baltimore. John Carrol era muito amigo do maçom Benjamin
Franklin e foi devido às pressões deste sobre a Santa Sé – na época, ainda
submissa à maçonaria – que Carrol foi nomeado Prefeito Apostólico dos Estados
Unidos da América, em 26 de novembro de 1784. Muito ajudou, também, a essa
nomeação a influência do irmão do bispo jesuíta, o maçom Charles Carrol de
Carrolton, signatário da Declaração de Independência e um dos mais ricos
latifundiários dos Estados Unidos.
A partir do bispo John Carrol (depois
arcebispo, com uma arquidiocese contendo 153 paróquias, e quatro condados, incluindo Washington), aos
poucos, a Igreja Católica nos Estados Unidos, eivada de “americanismo”, tomou o
seu próprio rumo, ignorando as orientações de Roma a ponto de criar o que foi
batizado de “Catecismo de Baltimore”.
Em 1784, 5 anos antes do início da Revolução
Burguesa na França, Cagliostro fundou o Rito de Mênfis-Misraim ou Rito da Alta
Maçonaria Egípcia, que mais tarde abrigou o espírito revolucionário de Garibaldi
e ocultistas famosos como Jean Bricaud e Theodore Reuss. No Brasil e América
Latina, os ideais iluministas insuflavam revoltas e revoluções lideradas por
maçons. O capitalismo nascente dava-se ares de libertário, mudava os apelidos
dos poderosos e se preparava para uma nova era, quando a escravidão seria
banida para dar lugar à exploração dos povos e ao colonialismo.
(Continua)
Excelente texto. Estou vendo que a última postagem foi da série foi feita em 2013. Não vai haver mas continuação?E as fontes, poderia publicar?
ResponderExcluirMuito obrigado pelo seu trabalho e pela transmissão de conhecimento, muito obrigado mesmo. Pena não ter continuado até aos dias de hoje. Para os interessados em continuar a pesquisa, aqui fica:
ResponderExcluirhttp://paradigmatrix.net/sociedade/conspiracoes/rothschild/o-golpe-dos-rothschild-na-batalha-de-waterloo/
http://www.alfredo-braga.pro.br/discussoes/fraudegananciaeusura.html
Com os melhores cumprimentos,