quarta-feira, 7 de julho de 2010

CANTIGA D'AMICO


(“...a Renascença tinha tardes assim
quando era abril...”)

"RETRATO EM TRÍPTICO DE VICTORIA EM ABRIL"

(OSSOS DO VENTO - ERNESTO WAYNE)




Sentiam saudades de mim em abril.
Os lunáticos poetas de sacadas e bandolins,
As moças francesas com seu perfume legítimo
E os menestréis, dedilhando minha história
Em devaneios de cravo bem temperado.

Em meu castelo de Victoria havia Van Goghs
E Waynes - famosos por seus trípticos -,
E floretes forjados em Florença
E encapuzados versos algozes do ritmo
Das naturezas-mortas em plena renascença.

Assim, quando era abril, em minhas tardes,
Pensava-me herdeiro de pensares...
Os quadros e os brasões a assinalarem
Passagens de meus pares, que, ao passarem,
Deixavam-me seus sonhos e alardes.

Havia em mim, talvez, um quedo medo;
O medo do talvez imponderável...
Saudade do saudável dormir cedo,
Yoga, mantra, tantra alvorecendo
Nos dias de bom vento.

Então, quando era abril, havia tardes
De casta sobriedade em meus prazeres:
O silencioso cilício da saudade
Vinha buscar sua herança, seus haveres...
E me encontrava só e deserdado,
Sempre tomando o mesmo mate-amargo.
Solidário, fingia-se amigo,
Respeitando meu silêncio de galpão...

Depois, com seu sorriso de mendigo,
Cobrava breve quinhão de minha idade,
Chorava meu chorar, compadecido,
E ia-se comigo.

Era abril, com certeza, e era Florença,
Pois meus Waynes sorriam com descrença
Da calma cor daquelas tardes presas,
Do meu silêncio tenso de represa.

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