- Tem ido ao cinema,
seu Chico?
- Mas!... É o que
mais tenho feito ultimamente. Lá em casa.
- Pensei que o senhor
estava assistindo os filmes do Festival de Santa Teresa.
- Pois aquela santa
fica um pouco longe. E depois, como o senhor há de saber, as sessões são um
pouco exclusivas, para uma determinada classe, eles com eles. Imagine se eu
chego e eles me vêem assim, pilchado.
- Acho que o senhor
iria fazer o maior sucesso. Pensariam que é um ator. E ainda por cima iam sair
a divulgar que até o povo foi ao tal de festival, que eles chamam da fronteira.
- Mas lá em Santa Teresa
não é bem fronteira. Ainda se fosse em Aceguá... Além do quê eu não me sentiria bem no meio de toda aquela
gente empetecada.
- Eles não andam mais
tão empetecados, seu Chico. A moda agora é a simplicidade. E é gente que gosta
de seguir a moda.
- Eu conheço essa
simplicidade... Mas isso pouco me importa, e lhe garanto que até iria ver esse
tal de festival de cinema, mas era capaz de me pedirem a carteirinha do
partido.
- Que partido?
- Aquele que organiza
o festival. Segundo estou informado é o Partido dos Dramas Trágicos.
- Dos males o menor,
seu Chico. Já imaginou se fosse o Partido das Tramóias?
- Com tanta gente
patrocinando, não seria uma grande surpresa. Sempre há de sobrar um dinheirinho
aqui, outro ali...
- Nem todos são
loucos por dinheiro.
- Claro que não. Os
que não fazem questão... Por falar nisso, o Carnaval está chegando e já tem
gente fazendo bloco só pra entrar na vaquinha do prefeito.
- Que vaquinha, seu
Chico? Agora o prefeito tem vacas?
- Pois não lhe duvido
nada. Se seguir o exemplo dos outros, vai terminar o segundo mandato com uma
duas ou três estâncias no Uruguai. Mas não é a isso que eu estava me referindo.
Falava do dinheirinho aquele que a Prefeitura dá pras organizações
carnavalescas e que todo ano vai engordar a conta bancária de muita gente. Ou
de alguns.
- Ah, sei... Esse
dinheiro não passa por licitação, não é seu Chico?
- Se vai passar! Não
chega a ser uma grande obra fazer um carnaval num cantinho de rua pro povo
fingir alegria por uns dias. Em tempos de inflação, o circo é o que mais
funciona. Diz-que grande obra é essa tal de festa do churrasco que era gratuita
e agora é paga e deve estar agradando muito os frigoríficos. Só não sei direito
qual deles. Aí deve ter licitação, o senhor não acha?
- Olhe que eu nunca
vi a imprensa da terra falar ou escrever nada a respeito. Muito menos o povo,
que quer mais é festa.
- A propósito,
voltando à vaca fria, não é também em Santa Teresa que fazem um carnaval à
parte, bem longe do povo?
- Pois é lá mesmo, seu
Chico.
- Mas essa santa está
ficando muito famosa! Se ela soubesse... E olhe que era carmelita descalça!
- As coisas mudam,
seu Chico.
- Mas bah! Tudo em nome da arte.
Muito boa matéria! É... Simplicidade virou moda, mas elite continua lá e o povo aqui.
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