Entraram na minha casa na manhã do
domingo passado, 9 de março de 2014. Levaram um notebook, máquina de fotografia
digital, uma webcam, dois aparelhos de som, algum dinheiro e mais algumas
coisas. Eu e Lidia estávamos dormindo. Ela acordou, viu as portas abertas e me
chamou. Teriam saído correndo quando ela levantou. Chamamos a polícia. Cerca de
vinte minutos depois, apareceu um casal de brigadianos, que constatou o fato.
Fizeram algumas perguntas e uma observação: “Não esperem reaver os objetos
roubados”.
De
tarde, fui registrar queixa na Polícia Civil. Atendeu-me um homem que foi logo
dizendo que era o único policial no estabelecimento. Estaria fazendo rodízio
com outro colega. A cada período um deles ficava ali, cumprindo a sua função
burocrática de registrar as ocorrências. Falei das possibilidades: há uma
construção ao lado, de onde os ladrões poderiam ter pulado para a nossa sacada,
um dos computadores estava sendo carregado quando ouviram vozes e fugiram; quem
sabe alguém que conhece a nossa rotina, talvez a perícia...
Perícia
nem pensar. Não naquele momento de tão poucos policiais em ação, um domingo,
dia de preguiça. Onde estariam os demais policiais? Provavelmente em outras
delegacias, ou em casa, ou quem sabe? Perícia só no dia seguinte, quando as
pistas estariam desfeitas. Viu os assaltantes? Não? Que pena, deveria ter
visto. Investigação? Está brincando?!
O
dia seguinte já passou, é de noite e não apareceu nenhum perito da polícia.
Investigação? Aqui é Bagé, Rio Grande do Sul, uma cidade que vive de
brincadeiras. Volta e meia, muitos bandidos são soltos da penitenciária local,
devido à superlotação ou a qualquer outro motivo que os juízes acreditarem
suficientes. Uma cidade que vive com medo. A polícia é ineficaz, quase
inexistente, vive de burocracias, queixa-se muito, mas não cumpre o seu papel.
É
o que todos com quem falamos hoje nos disseram. Polícia? Só existe
oficialmente. Está provado que nada faz. Ou faz muito pouco em comparação com
os múltiplos crimes na cidade; alguns não são nem veiculados, como o que
aconteceu ontem na minha casa. Polícia, aqui, existe apenas para comprovar que
houve crime, como se fosse uma instituição dedicada a estatísticas.
Aqui
é Bagé, uma cidade que prefere esconder a sujeira embaixo do tapete da sala.
Quando o tapete apodrece, jogam fora silenciosamente. No dia 28 de fevereiro
passado, uma turba de mais de 100 pessoas quebrou o Clube Comercial e depois
desceu a Avenida Sete de Setembro destruindo tudo o que encontrava: vitrinas,
portas de casas comerciais, containers de lixo. Houve furtos e briga
generalizada. A polícia? Ninguém foi preso ou impedido de agir. Melifluamente,
alguns veículos de comunicação colocaram a culpa em um cantor de funk que não teria
comparecido ao clube onde tudo começou. Implicitamente, ficou estabelecido que
as pessoas dadas a esse tipo de festa, caso ficarem insatisfeitas poderão
quebrar, brigar e até incendiar a cidade, se assim desejarem. A culpa sempre
será da vítima e a polícia não aparecerá.
Aqui
é Bagé, a cidade do medo. Serviços de vigilância são contratados, colocam-se
grades e fechaduras cada vez mais sofisticadas em portas e janelas; saímos à
rua de carro e quando muito necessário. E nada disso adianta. Polícia? Não há
policiamento preventivo ou ostensivo, porque os assaltos continuam acontecendo
com muita freqüência. Criminosos de todo tipo gozam, nesta cidade, de uma
grande sensação de impunidade.
Sei
de casos escabrosos, como um restaurante aqui perto, que foi invadido por
marginais, também em um domingo pela manhã. Fizeram de tudo e a polícia só
apareceu quando foi chamada. Eu moro bem no centro da cidade e no meu quarteirão
poucas casas ainda não foram invadidas e assaltadas. Não adianta serviço de
vigilância de qualquer espécie. Os ladrões entram quando e como querem.
Aqui
é Bagé, terra dos bêbados e drogados. A cada duas quadras existem botecos,
antros onde se reúne gente de toda espécie, e ali ficam durante o dia e parte
da noite bebendo e usando suas drogas favoritas. Sabe-se exatamente onde fica o
lugar, ou os lugares, onde usuários de crack são visitados por traficantes e
fumam a morte. Nada é feito. Polícia? A polícia espera pelos crimes para
depois, talvez, agir. Secretaria de Segurança? Um provável cabide de empregos.
Disseram-me
que tivemos muita sorte. Somente roubaram algumas coisas e não nos agrediram
fisicamente. Aqui é Bagé, cidade da insegurança, onde as pessoas ficam felizes
quando a violência é pouca. Polícia?
Pior do que a invasão que sofremos, foi a depressão que sentimos ao meditarmos nesta sociedade tão desamparada pelo sistema cruel, fruto do capitalismo cada vez mais selvagem campeando mundo afora. Parabéns pela postagem!
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