- Diga-me, seu Chico,
o Pútin recuou?
- Antes de tudo,
trata-se de um político, esta é que é a verdade! Depois, permanecer com as
tropas ali na fronteira com a Ucrânia, gastando com alimentação e tudo o que o
senhor possa imaginar, é contraproducente – como diria o próprio Pútin. Já fez
a sua demonstração militar na Criméia, provou para o mundo que as Forças
Armadas russas são muito fortes e coisa e tal, e agora está na hora das conversações.
- É uma pena, seu
Chico. Eu tenho lido comentários de muita gente que acha que a Rússia poderia
ser uma alternativa ao império, e agora, com essas conversações políticas, como
o senhor diz...
- Só há uma
alternativa ao império: a conscientização popular. No dia em que o povo decidir
não beber mais aquele refrigerante venenoso que eu me nego a dizer o nome, não
assistir mais aos filmes feitos por babacas e para babacas, dos Estados Unidos,
não usar mais as roupas deles, os carros deles, os celulares deles, toda aquela
parafernália de produtos que eles querem nos enfiar goela abaixo, como se
fossem muito necessários... Nesse dia teremos alguma esperança de uma
alternativa ao império, porque este é um império baseado no capital, no lucro,
no consumo, na matéria e na absoluta falta de moral.
- Isso é quase
impossível, seu Chico! Imagine o nosso povo não querendo consumir, tão
domesticado que está a aceitar qualquer propaganda como verdade
incontestável... Tem gente que se endivida só para comprar um carro ou uma
roupa de grife ou um daqueles aparelhinhos portáteis, e depois se queixam da
vida, da inflação, mas querem aparentar, aparecer aos outros como alguém que
tem o que a propaganda manda ter...
- Materialistas! Esta
é uma sociedade de materialistas e de zumbis programados para o consumo – o senhor
há de concordar comigo. Salva-se pouca gente. Mas eu não me refiro à sociedade
que já está viciada em porcarias e acredita que a vida é feita de chips,
anteninhas e trocas de mensagens afetuosas. Cultura zero! Espiritualidade zero!
E não entenda espiritualidade o fato de ir à igreja, ficar rezando, praticar
ioga ou recitar mantras. É muito mais que isso. Antes de tudo trata-se de
sentir a vida, agradecer pela beleza da natureza e lutar para que essa beleza não
continue a ser destruída, adquirir consciência social e lutar pelas causas
populares, porque só no povo está o poder de transformar a sociedade.
- Mas no nosso povo,
seu Chico!
- Pois saiba que o
nosso povo é surpreendente Assim como está assistindo a novelas ou a jogos de
futebol, também está nas ruas exigindo os seus direitos. Chega um momento em
que o povo não agüenta mais tanta desonestidade e começa a se dar conta de que
a vida é muito séria. Não diziam que o povo da Índia era feito de alienados?
Pois expulsaram os ingleses através da desobediência civil e o boicote a todos
os produtos importados.
- Gandhi?
- Não somente Gandhi,
mas toda a sociedade indu. Gandhi foi um dos líderes. Vivemos numa sociedade
que adora criar ícones e que detesta reconhecer a união popular. O nosso povo
pode, sim, fazer a sua revolução, e não são poucas as opressões que temos
sofrido. Um decreto presidencial contra o povo não é opressivo? Um Congresso
que legisla em causa própria não é uma vergonha que vemos todos os dias? Um
Judiciário que decide de acordo com interesses, muitas vezes escusos, não é um
descalabro e uma ofensa à própria Justiça? O povo está vendo tudo isso. E se
organizando.
- Eu não vejo essa
organização.
- Não vemos tanta
coisa!... Mas voltando à vaca fria... O tal de Pútin, que um dia eu pensei que
era gaúcho, pela valentia demonstrada... Ele também tem que prestar contas ao
povo russo, cuidar dos seus interesses. E não é só ele: é o próprio povo que o
elegeu e que o apóia quase totalmente que pede uma mudança nas relações
internacionais, que não significa, necessariamente, uma guerra neste momento.
De preferência, em nenhum momento. A Rússia é um exemplo pela cultura e pela
coragem. Não foram eles que venceram a II Guerra Mundial?
- É verdade, seu
Chico. Embora digam que foi os Estados Unidos, que só se aproveitou do caos
europeu para lá estacionar os seus exércitos. Enquanto isto, jogavam bombas
atômicas nas cidades japonesas.
- Com a tecnologia
dos cientistas alemães, diga-se de passagem. A história da humanidade é uma
sucessão de mentiras criadas pelos vencedores das guerras. O grande medo deles
é do povo organizado – me acredite. Quanto aos donos do poder, aqueles que
aparecem para as fotos, se não obedeceram à vontade do povo, cedo ou tarde
serão esquecidos.
- Mas ainda há uma
possibilidade, seu Chico. Eu acredito.
- Eu também. Eu
acredito na força do povo. Dos povos do mundo inteiro.
Muito boa matéria! S.Chico e interlocutor impagáveis. Parabéns!
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