- Pai, o que é o Coelhinho da Páscoa?
- O Coelhinho da Páscoa era um cara
que morreu de cruz e o apelido dele era Coelhinho. Na verdade, é Coelhinho do Páscoa e não da Páscoa. Tem gente que fala muito errado, filho.
- E por que ele morreu de cruz?
- É que ele gostava muito de comer chocolate
e um dia se engasgou com a cruz.
- Pai, o que é cruz?
- Cruz é um brinquedinho que vem, às
vezes, dentro dos ovos de Páscoa.
- E como é que a gente brinca?
- De tudo que é jeito. Dá pra brincar
de pendurar pedacinhos de chocolate, atirar nos outros, chutar, jogar na
irmãzinha... Só não pode é comer que dá aquele problema que matou o Coelhinho do
Páscoa.
- E Páscoa, pai, o que é Páscoa?
- O Páscoa foi um grande time de
futebol. Grande, bem grandão! Páscoa Futebol Clube. Tão grande que tinha
estádios em todas as cidades do país. Só que chamavam os estádios do Páscoa de igrejas, em vez de arenas – olha só a ignorância desse povo!
- É mesmo, pai, que povo ignorante! E
aí, pai, e aí? Conta pra mim, pai, conta!
- O Páscoa só tinha craques, filho.
- O Neymar também?
- O Neymar, o Messi, o Pelé, o
Maradona, o Zico... Puro eles, filho, puro eles! Ganhavam uma fortuna!
- E o Coelhinho, pai, qual era a
posição do Coelhinho?
- O Coelhinho era um centroavante
alto, forte, do tipo trombador. Driblava que era uma maravilha! E também sabia
brigar. Que ninguém se metesse com ele!
- E era expulso, pai?
- Como é que vão expulsar jogador
rico, filho? Aonde já se viu uma coisa dessas? Mais fácil o Coelhinho expulsar
o juiz. Ora, tu me sai com cada uma...
- Desculpa, pai, eu não me lembrava
que rico não pode ser expulso.
- Pois é bom não esquecer, filho. Por
falar nisso, como vão os estudos?
- Eu não gosto de Matemática, pai. Nem
de Português, Geografia...
- E alguém aqui falou em Matemática e
essas outras coisas? Isso não dá dinheiro. Quero saber como vai na escolinha de
futebol.
- Agora estou aprendendo embaixadas,
pai. O professor disse pra eu fazer cem embaixadinhas no fim de semana.
- Então te concentra, filho. Depois desta
nossa conversa tu vai pro pátio e não faz cem, mas duzentas embaixadinhas! E
deixa que eu filmo.
- Tá, pai. Mas eu queria saber mais do
Coelhinho. Por que chamavam ele de Coelhinho?
- Pela velocidade. E isso é outra
coisa que tu tem que desenvolver – velocidade e força dão uma grana!...
- Ele corria muito, pai?
- O Coelhinho? Corria, trombava,
passava por cima dos zagueiros, derrubava o goleiro, entrava com bola e tudo.
- Que maravilha, pai! E nem recebia
cartão!
- De vez em quando, quando era pra ele
se poupar na outra partida, avisavam o juiz e ele dava um amarelinho pro
Coelhinho.
- E o time do Páscoa ainda existe,
pai?
- Acabou, filho. Uma tristeza...
Ninguém sabe como, até dizem por aí que os jogadores receberam um salário
extra, um dinheirão que não receberiam nem em cem anos, só pra perderem daquela
maneira. Parece que tinha coisa de empresário no meio, da CBF, da FIFA, eles
tinham que acabar com o Páscoa que estava monopolizando, entende? Deixar espaço
pra outros times. Essas coisas acontecem... É tudo um jogo, filho, é tudo um
jogo. Mas daquele jeito foi demais!
- Perdeu, pai? Mas o Neymar não jogou?
- Pois o Neymar se lesionou quase na
véspera do jogo. Uma lesão feia! Não dava pra jogar, entende filho? O Pelé, o
Maradona e o Zico estavam se aposentando e o Messi tinha sido negociado com o
Barcelona. Mesmo assim, o Páscoa tinha um baita time! Jogadores de primeira
linha, todos formados em faculdades de futebol, com mestrado e doutorado.
Ninguém entendeu aquela derrota, e por goleada! Foi uma choradeira... Ainda bem
que tinha o Felipense pra matar no peito. Botaram toda a culpa nele e os
jogadores saíram limpinhos pra irem jogar em times da Europa, ganhando milhões.
- Quem era o Filipense, pai?
- O treinador do Páscoa. Foi com ele
que o Páscoa foi penta-campeão mundial. Dá pra imaginar? Mas os outros times
reclamavam muito, não dava pra ser hexa. E depois que perdeu o jogo, o Felipense,
que não sabia de toda aquela trama, começou a receber e-mails da torcida
enfurecida. E-mails que depois foram publicados por esses intelectuais, gente
que pede esmolas, e apelidados de epístolas ao Felipense.
- O que é epístola, pai?
- É o mesmo que mensagem de texto,
filho. E a torcida do Corinthians foi a que mais reclamou, tanto que surgiu
outro livro intitulado epístolas dos Coríntios. E ainda outras... Tem epístolas
de tudo que é jeito.
- Mas o Páscoa perdeu pra quem, pai?
- Pro Sexta-Feira Santa.
- Nunca ouvi falar em Sexta-Feira
Santa, pai. Que nome estranho...
- Nem vai ouvir mais, filho. Foi um
time organizado só pra aquele jogo, formado por aqueles alemães da serra, altos,
fortes, que gostam de tomar cerveja e participar daquelas bandinhas. A novidade
era o treinador, que não era um treinador, mas uma treinadora. Dizem que era
Mãe de Santo, ou Mãe de Santa. Atendia nas sextas-feiras. Daí o nome do time.
- Ah... E quanto foi o jogo, pai?
- Sete a um, filho! Parece conta de
mentiroso, não parece? E foi mesmo. Dizem que foi uma grande mentira e como os
jogadores sabiam que tinham que perder, e de goleada, preferiram levar os gols
logo em seguida, ainda no primeiro tempo. É o que dizem, eu não tô afirmando
nada.
- E o Coelhinho jogou, pai?
- Teve que jogar por obrigação do
contrato. Não escapou, não deu pra fingir lesão ou coisa assim, entende filho?
E, por sinal, fez um golaço, o gol de honra do Páscoa.
- Pai, só outra coisa: e esse tal de Jesus,
que falam tanto?
- Jesus era o goleiro. Jesus Cristo era o nome completo. Como sofreu!...
Levar sete gols só numa partida não é brincadeira, filho. Tanto, que aqueles
gols foram apelidados de as sete chagas de Cristo. E o Coelhinho, que não sabia
de nada, ou tinha recebido muito pouco pra perder ou não gostava de entregar a
partida... nem gosto de falar nisso!
- Por que, pai?
- Dizem que foi por isso que ele
morreu. Ou se suicidou. De noite, chegou em casa, tomou umas e outras e comeu
um ovo de chocolate inteiro, com cruz e tudo. Engasgou e deu pra bola! E por
isso a gente comemora este dia comendo chocolate, em memória do Coelhinho. Agora
chega de perguntas, filho. Tá na hora da tarefa das embaixadinhas.
- Posso comer um ovo antes, pai?
- Pode, mas cuidado com a cruz!
Muito engraçado. Bons toques de Páscoa. Valeu, Blogueiro!
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