sexta-feira, 28 de junho de 2013

SEU CHICO E A PASSEATA




Encontrei seu Chico dois dias após a terceira passeata dos 300 que os jornais daqui disseram que eram 1.500 “ou bem mais”, segundo um excitado repórter. Estava sentado em um dos tristes bancos da praça, olhando o movimento – carros passando e pessoas comprando entusiasticamente.

- E então, seu Chico, foi na passeata?

- Mas se fui! Isso é coisa que acontece uma vez na vida e outra na morte. Me pilchei e enveredei pra Praça da Matriz. Quando cheguei vi aquela gurizada e um que outro mais velho, meio deslocados como eu, e quando souberam que eu ia me manifestar junto, os guris me cercaram e alguém chegou a dizer que era a força do campo se fazendo representar e eu todo faceiro – o senhor imagine! – e logo me deram um cartaz e pediram que eu escrevesse ali a minha reivindicação e eu não sabia bem qual era, e olhei pra uns cartazes onde estava escrito “Abaixo a Corrupção” ou “Fora a PEC 37” e outros que tais e todo mundo apitava que era uma beleza de se ouvir, vi uns mascarados que nem no carnaval e um deles com uma máscara com uns olhinhos de finório e um cavanhaque sem-vergonha chegou pra mim e perguntou se eu queria comprar um kit-manifestação.

- E o senhor comprou?

- Tive que marchar com quinze pilas. Uma beleza de kit, nem lhe conto! Tinha apito, aquela máscara que depois me disseram que era anônima ou de um anônimo, não sei bem, bandeira do Brasil – e eu querendo a bandeira da República Rio-Grandense, veja só! – e mais umas coisinhas que não verifiquei direito, porque em seguida partiu a ordem de caminhar pela avenida Sete. Uns dois ou três daqueles mascarados e pintados comandavam e eu me deixei ficar mais pra trás pra terminar o meu cartaz, junto com um cidadão que escrevia o seu pedindo aumento pros aposentados – imagine se vão dar...

- E o que o senhor escreveu?

- Pois na hora, assim, me veio uma idéia, lembrei daquela celeuma sobre o novo salário e direitos das domésticas e escrevi, lembrando da peonada que trabalha por comida e casa e um troco qualquer no fim de semana: “Direitos Iguais Para Peões de Estância e Domésticas”.

- O senhor quer tirar o lucro da boca dos patrões, seu Chico?

- Não era a minha intenção. Os patrões que comam o seu lucro, mas vamos e venhamos que peão de estância é bicho xucro que não conhece seus direitos e está mais que na hora de reivindicar equiparação com as domésticas. Sem contar o Bolsa-Família e mais aqueles cinco mil que a dona Dilma está liberando pra avivar o mercado. Peão de estância também deve ter direito a casa e eletrodomésticos, o senhor não acha? É uma questão de justiça. Escrevi, peguei o cartaz e saí quase correndo atrás do bando que já descia a Sete. Quando chegamos ali pela praça onde a estátua do Silveira Martins um dia deu guarida pra um ninho de joão-de-barro a turma parou pra fazer pose pra televisão e gente da imprensa. Alguns deram entrevista e eu ali, que nem a estátua do político até que chegou um repórter e perguntou como é que eu estava me sentindo.

- O que foi que o senhor respondeu?

- Que estava sentindo frio, é lógico. Sabe aquela friagem da tardinha no inverno? Pois é. Sem contar que bateu um ventinho e ameaçou garoar e eu resolvi dar umas apitadas para aquecer as bochechas e bati com as botas no chão e não sei se foi por isso que em seguida liberaram a passagem, os repórteres se arredaram e todo mundo seguiu apitando e gritando. E eu atrás.

- Feliz da vida, seu Chico.

- Mas!... Quem não fica feliz da vida ao participar de uma passeata na hora do chimarrão e da música gaudéria sentindo o minuano arrepiar os cabelos? Tudo pela peonada, pensei, ao sentir saudades do mate, e continuei apitando até não ouvir mais nada, porque o senhor há de entender que quem muito apita pouco escuta, e lá pelas tantas quando eu já pensava em me retirar, depois de cumprir o dever cívico, eis que gritaram a palavra de ordem “Abaixo a Cura Guei” e eu gritei: Isso não!

- Seu Chico! Então o senhor não sabe que não pode ser contra os gays?

- Mas e eu lá sou contra alguém, seja guei, pirata ou nordestino? Muito pelo contrário! Defendo tudo e todos, e não tava lá defendendo a peonada que não sabe se defender sozinha? Mas isso de ser contra uma cura eu não sou. Pois não estavam gritando contra a corrupção, a favor da educação e da saúde? E como é que podem gritar a favor da saúde se são contra uma cura? E foi por isso que eu gritei aquilo e logo me cercaram aqueles mascarados e outros nem tanto e começaram a gritar que eu tinha medo dos homens.

- Gritaram que o senhor é homofóbico, seu Chico?

- Foi essa a expressão, que eu logo traduzi pra eles que parece que de tanto apitar perderam o dom da compreensão. Homo não significa o gênero humano e fóbico não vem de fobia, que é medo? Logo, homofóbico é igual a medo das pessoas, e eu lá sou de ter medo? Nem de mula-sem-cabeça em noite de lua cheia! Quanto mais de gente! Respeito a todos, desde que me respeitem, seja homem, mulher, criança, não interessa o credo ou orientação política. Todos têm direito a viver da maneira que quiserem desde que não incomodem os outros. Até veado eu respeito; não entendo, mas respeito, são coisas da vida, tem gente de tudo o que é tipo.

- Mas seu Chico, cura gay é justamente um projeto para curar o que o senhor chama de veados, que não devem mais ser chamados assim, porque agora virou moda ser veado ou gay e quem não for... Como é que eu vou lhe dizer...

- Não me diga uma coisa dessas! Acho que o senhor anda vendo manifestos demais na televisão. Isso sim virou moda. Tanto é assim, que eu estava lá participando, apitando, gritando contra a corrupção, a favor disso e contra aquilo, porque é uma beleza ver o povo gritando contra o governo que eles elegeram e vão acabar elegendo de novo por falta de opção. Votar em quem? Se bem que “povo” é força de expressão. Não vi nenhum trabalhador, com exceção daquele que já é aposentado e tava com uma cara de fome igual a todos os aposentados, acredito. Era mais uma gurizada. Filhos, netos, parentes de promotores.

- Parentes de promotores?

- E não estavam lá gritando contra a tal de PEC 37, que seria um projeto de lei para tirar o poder do Ministério Público, segundo me consta? Devem ser todos parentes dos promotores. Eu também gritei contra. Quero mais é que os promotores se mexam e façam alguma coisa contra a corrupção, mesmo sabendo que condenar não adianta nada, porque os juízes soltam ou deixam soltos os corruptos como foi agora a pouco no julgamento do Mensalão. Condenaram não sei quantos! E onde estão esses não sei quantos? Na cadeia? Que nada! Pra cadeia só vai pobre, neste país. Os corruptos ficam gozando a vida, amparados justamente em leis que favorecem a liberdade da corrupção.

- Corrupção agora é crime hediondo, seu Chico, e a PEC 37 caiu.

- Pois não era pra cair? Se não fosse não teriam gritado tanto. E tachar corrupção de crime hediondo será que vai adiantar alguma coisa? Se fosse assim, tinham que prender todo o mundo, a começar pelos bicheiros e pelos que jogam no bicho que são todos, ou o senhor nunca fez uma fezinha? Será que vão prender os comerciantes que aumentam os preços, os fabricantes que botam porcaria nos alimentos, os plantadores de soja e de arroz transgênicos que corrompem a natureza? Vão prender a dona Dilma que está construindo Belo Monte - uma bela corrupção contra a natureza e os povos indígenas? Eles fazem essas leis por desencargo de consciência e medo de serem apedrejados ou perderem a próxima eleição, que está muito próxima.

- Conte mais sobre a passeata.

- Pois é. Depois que eu falei aquilo pra eles, sobre a tradução correta da palavra “homofóbico”, os guris e gurias ficaram me olhando com uma cara assim, meio de apalermados, sem saber direito o que dizer, até que chegou um daqueles mascarados e perguntou se eu era louco. Tentei sair pela tangente e respondi que de nada até que eu podia ser um pouco louco, porque “de poeta e de louco todos temos um pouco” e de vez em quando eu escrevo lá as minhas quadrinhas. E – veja o senhor! – pararam ali mesmo e me pediram pra recitar uns versinhos. Imagine a situação! Mas quem tem santo forte não se aperta. Dei uma pensada e me saí com essa:

“Neste Brasil muito jovem
Que revela consciência
Todos estes que se movem
São contra a violência.”

- Uma boa quadrinha, seu Chico.

- Pois não é? E acho até que agradei. Me abraçaram, beijaram e até me ofereceram um mate, que não pude recusar, porque essa juventude protesta mas não esquece do que é bom. A continuar assim, estou quase acreditando que as coisas podem mudar de verdade.

- E a cura gay, seu Chico?

- Pois, pensando bem eu me dou conta de que às vezes eu sou um pouco reacionário. Os tempos mudam. Agora, quanto a aderir... Olhe, os muito veados que me perdoem, mas eu gosto mesmo é de mulher: a coisa mais linda que Deus já fez nesta terra de tantas maldades. Agora, se não querem ser curados, que se pode fazer? Cada um com seu cada um e viva as diferenças!, como diz o outro. Até os bichinhos de Deus não são todos diferentes uns dos outros? E ai de nós se não existisse essa diversidade...

- Então, tudo terminou bem?

- No final das contas, pra lhe dizer a verdade até que gostei. Lá pelas tantas, me queixei da dor nos calos e me retirei, porque o senhor sabe que eu não sou mais tão jovem assim. E fiquei olhando aquele pessoal caminhando e cantando e até lembrei outros tempos...

- Que bom, seu Chico. Até parece mentira.

- Pois não parece?

sábado, 22 de junho de 2013

À DIREITA DA DIREITA


“Sem partido!, sem partido!” – curioso movimento  que opta pela alienação, justamente quando se diz formado por pessoas engajadas. “Você é engajado?” – pergunta o programa da tarde da Globo News, no dia 21 de junho, início oficial deste inverno que ameaçava se transformar em Primavera. Todas as “Primaveras” tem sido reacionárias e promovidas pelo sistema que usa jovens adolescentes ou pouco mais que isso para os seus objetivos claramente antidemocráticos.

   A primeira “Primavera” foi a de Praga, em 1968, na então Tchecoslováquia, quando reformistas com o apoio do Ocidente tomaram o poder, incitando o povo à rebelião contra o governo socialista. O objetivo, que foi alcançado, era atrair a invasão soviética no pior momento da guerra fria que ameaçava se tornar muito quente e atômica. Naquela época não existia Internet e radiotransmissores foram utilizados para galvanizar a população contra a opressão provocada.

   A Primavera polonesa teve origem com a fundação do direitista sindicato Solidariedade, nos anos ‘80, liderado por Lech Walesa, cuja única ideologia era o catolicismo. Em 1978, o autodenominado “mundo livre” escolhera o polonês Karol Woytila como Papa João Paulo II, logo após a estranha morte de João Paulo I, e a sua influência carismática na Polônia aliada à presença demagógica de Lech Walesa levou a Polônia a sucessivas greves e movimentos sociais.

   O ex-diretor da CIA, Robert Gates, escreveu, em 1996, no seu “Livro das Sombras”, que a CIA foi mais ativa na Polônia na década de ’80, e até mesmo “forneceu boa quantidade de dinheiro e equipamentos para a resistência polonesa”. Inclusive uma televisão clandestina, que, na véspera da visita do Papa substituiu o telejornal de Varsóvia com uma mensagem pedindo aos ativistas para participar de manifestações públicas. No entanto, ainda não foi confirmado se Lech Walesa – Prêmio Nobel da Paz em 1983 – era agente pago pela CIA. Há evidências, não provas.

   A Primavera Árabe, alusão à Primavera de Praga, iniciou na Tunísia em dezembro de 2010, expandiu-se para a Argélia e Egito – estratégicos países da África do Norte – e, depois de conquistar o poder naqueles três países contou com o apoio das forças da OTAN para derrubar o regime socialista islâmico de Moamar Kadhaffi, que foi assassinado pelos primaveris mercenários que penetraram no território líbio através das fronteiras da Tunísia, Argélia e Egito.

   Atualmente, a Primavera Árabe tenta derrubar o governo da Síria, e os países ocidentais estão nisso muito empenhados, não só para roubar os minérios de petróleo e gás, mas também para forçar uma definitiva rota de colisão com o Irã e, posteriormente, Rússia. Os mercenários que estão sendo derrotados na Síria, após dois anos de combates apelidados de “revolta popular” pelos meios de comunicação do Ocidente, entram naquele país através das fronteiras da Jordânia, Líbano e Israel. Em breve, receberão grande auxílio em armas, munições e dinheiro dos Estados Unidos e aliados europeus. Não está descartado um ataque aéreo das mesmas forças da OTAN que destruíram a Líbia.

   As revoltas no Brasil, iniciadas há mais de uma semana, têm objetivos democráticos e se pretendiam pacíficas em seu início, constando de manifestações pelo passe livre, contra a corrupção, os gastos com a Copa de 2014, a impunidade e a lerdeza do Governo em resolver problemas que estão se tornando crônicos, como a saúde, a educação e a segurança, entre outros. Debate-se, também, a legitimidade dos políticos.

   Não sei de nenhuma crítica contra o latifúndio, contra o massacre de indígenas, a favor da reforma agrária, a favor da reforma urbana, contra o desmatamento desenfreado, contra a desertificação, contra a grilagem (roubo de terras), contra a hidrelétrica de Belo Monte e outras hidrelétricas que ameaçam devastar ainda mais a fauna e flora e provocam a destruição de diversas etnias de povos indígenas.

   Não tomei conhecimento de qualquer crítica que pretenda aprofundar ainda mais o debate político propondo, por exemplo, a transformação da nossa democracia - de representativa em participativa.

   Não estou sabendo de nenhum protesto ou proposta de debate que busque transformar a decadente democracia pequeno-burguesa brasileira, voltada somente para os interesses monopolistas das grandes multinacionais, em uma democracia realmente popular.

   Ninguém, que eu saiba, propõe o fim do modelo neoliberal. Ninguém critica os acordos com os Estados Unidos, com a União Européia, que fazem do Brasil um país exportador a serviço daquelas potências. Ninguém coloca em debate a presença das Forças Armadas brasileiras no Haiti e da nossa Marinha de guerra nas costas do Líbano, em apoio à OTAN. Ninguém contesta o atrelamento ao monetarismo capitalista, origem e causa da inflação.

   A política está proibida nesses movimentos. Os partidos políticos não podem se manifestar, caso em contrário os seus membros são espancados e as suas bandeiras rasgadas e queimadas. Uma onda de alienação varre o Brasil. Varre e destrói.

   “Você é engajado?” – pergunta a Rede Globo para pessoas que acreditam que engajamento é sinônimo de depredação. “Estamos recriando o Brasil”, diz um dos motes do movimento. Sobre que bases? Qual a proposta? Tudo indica que a proposta é dizer não a todas as propostas, transformar o país em terra arrasada e dar motivo para que os magoados militares que estão tendo o seu passado antipatriótico de golpistas desvendado reassumam o poder no instante em que o Governo revelar toda a sua ineficácia e incapacidade também em conter vândalos.

  O que é feito da polícia que não age preventivamente? Porque as passeatas são marcadas para o fim de tarde, entrando pela noite? Há sérias suspeitas a respeito da acanhada ação policial, que deixa depredar para depois agir. 

   Se assim continuar, as Forças Armadas terão motivos para golpear novamente a Constituição, despejar Dilma e todos os seus colegas de Brasília sob o pretexto de que o país está ingovernável.

   Trecho de uma mensagem recebida através do Facebook:


“Hoje na praça sete ocorreram várias ações muito suspeitas: 1°) um conjunto de grupos estiveram presentes de rostos tampados e que ninguém sabia dar alguma referencia e que parece que não estiveram presentes em mobilizações anteriores. Estes partiram para a depredação e atos de violência. Quebraram ônibus, alguns equipamentos e locais privados.
2) O centro estava completamente vazio de policiais. Não se pode ver nenhuma viatura de policial ou algum batalhão especializado. Depois das 22h ninguém deu noticias de nenhum elemento da segurança pública nas ruas. Seja na porta da prefeitura, nas esquinas ou mesmo quarteirões de distancia da praça sete. Parece que a ordem era abandonar o centro.

“Diante destes dois elementos, não é difícil acreditar que se trata de uma ação coordenada e deliberada para deslegitimar as ações de massas nas ruas! Parece ter sido algo deliberado pelos governantes para tentar abafar e descredibilizar ação popular.

“Temos que acompanhar o movimento nos meios de comunicação. Se houver um grande número de matérias enfatizando unicamente as ações de violência e depredação, restará claro que é algo coordenado e deliberado para tais fins! (...)”

Não é a única mensagem com o mesmo teor. Tentativa de golpe da direita que se infiltrou no movimento e quer norteá-lo contra tudo o que significa política e políticos. Infiltração e oportunismo. Mas o PT não é de direita? – perguntarão. Óbvio. Por seus frutos o conhecemos. E é contra esses frutos podres que o povo está nas ruas. A grande maioria do povo. Contra a corrupção e todos os desmandos.

Ocorre que a direita mais reacionária, que está à direita da direita governista – o pessoal ligado aos partidos saudosos da ditadura militar – considera o PT de “esquerda”, uma esquerda que segue os postulados de Gramsci, que não era marxista, mas marxólogo. Equivoca-se a direita explícita, que não tem qualquer ideólogo para justificá-la. O gramscismo nunca gerou qualquer revolução, simplesmente porque ignora a luta de classes e não se apóia no povo, mas na classe média, confundindo socialismo com consumismo. Se “as revoluções são a locomotiva da História”, conforme escreveu Marx, “a teoria sem a prática de nada vale, a prática sem a teoria é cega”, explicou Lênin.

E qual é a principal palavra de ordem desse movimento que era claro em suas legítimas intenções e está se transformando em uma coisa muito estranha? “Sem partido!” – e isso resume tudo. É a voz da direita gritando, mesmo que pela boca de milhares de jovens que nada entendem de política. Massa de manobra.

Qualquer movimento que venha da direita sempre será golpe ou tentativa de golpe de estado e sempre terá o apoio de militares subordinados ao capital e ao império. Não existe revolução de direita, porque direita é estagnação, defesa de interesses oligárquicos, exatamente o oposto de revolução, que significa transformação social.

Sem partido é o que aconteceu logo após o golpe de ’64, quando a ditadura aboliu os partidos políticos, porque deles não necessitava e somente os reeditou quando sentiu a necessidade de se legitimar. A direita ojeriza partidos e idéias políticas; sente-se raivosa e ofendida com propostas que não partam da sua própria mente pervertida e ociosa; seu lema é a morte da idéias, tem como práxis a opressão e como teoria a mutilação das organizações sociais.

A mídia subserviente à direita insiste que o movimento não tem lideranças, o que é uma mentira descarada, porque nada acontece por acaso, tampouco existe geração espontânea. É preciso identificar quem são os agentes infiltrados nesse movimento de massas tão necessário a um Brasil que dormitava e resmungava as suas dores e agora grita e esperneia, quebra e estilhaça na tentativa de destroçar ícones odientos, mas corre o perigo de ser manipulado para o abismo da tirania.

terça-feira, 18 de junho de 2013

O PODER DA REDE


A Globo decidiu: entre os manifestantes de índole pacífica e que só desejam tarifas mais baratas nos transportes públicos existem perigosos baderneiros, talvez terroristas infiltrados, responsáveis por depredações e incitamento à violência, o que faz com que os coitados dos policiais reajam destemidamente, atirando agora com balas de chumbo, posto que as balas de borracha estão proibidas.

   A Globo decidiu e a sua versão está sendo replicada em todos os outros veículos de comunicação, inclusive os oficialmente não globais, até entre os concorrentes, como Record e Bandeirantes, que se fingem de bonzinhos, colocando toda a culpa da falsa informação nas costas da inofensiva Globo – também conhecida como A Rede.

   A Globo decidiu e logo veremos e ouviremos membros do Governo, ou o que dele resta, afirmando que o povo brasileiro é bom e pacato, sempre foi assim, desde a época colonial e deve continuar agindo como inofensivo colonizado, manifestando-se contra os aumentos abusivos – o que é um direito – e nada mais, porque o restante cabe a ele, o Governo, todo-poderoso para fazer do país um único e grande negócio muito particular e o povo que proteste, vez que outra, porque isso é bom e salutar - melhor gritar do que estressar.

   A Globo decidiu e não demorará muito para ficarmos sabendo que pessoas especializadas em revoltas populares – quem sabe árabes anti-sionistas, russos ainda comunistas, chineses saudosos do socialismo ou os deprecados médicos cubanos – estão se esgueirando maquiavelicamente entre os manifestantes com o objetivo de transformar pontuais protestos contra a suba de preços em luta popular contra um sistema corrupto tão acostumado à própria corrupção que considera natural o roubo e o engano, porque o povo brasileiro não é dado a esses exageros e só resta a alternativa da maldade externa a incitar as mentes jovens de estudantes exacerbados.

   A Globo decidiu e em seguida será repetidamente veiculado que o povo de verdade, os trabalhadores amordaçados aos sindicatos governamentais não estão protestando, tampouco os miseráveis que a Dilma sustenta, talvez porque não podem se sustentar em pé e fazer longas marchas devido à fome e à fraqueza, somente os jovens muito jovens, internautas que cansaram do Facebook e outras redes sociais e protestam somente por diversão, novidade, porque sabem que na Turquia e outros países muito distantes o povo sai às ruas contra os seus governos e nós, brasileiros, temos o hábito ancestral de imitar, somente imitar aquilo que acontece, que é moda em outros países e as manifestações logo se diluirão com a chegada do inverno.

   A Globo decidiu que as manifestações são um suave vento de mudanças que acontece eventualmente, necessário para arejar a democracia, como disse a adestrada Dilma que está muito feliz porque ainda não protestaram contra o seu Belo Monte e outros montes não tão belos e igualmente predadores, e o futebol tão neimarmente maravilhoso é superior, muito superior a qualquer protesto – conforme disse aquele representante da milionária FIFA; um vento que passa, como passam todos os ventos e não se assustem empresários!, tudo voltará ao normal dos grandes negócios e negociatas em pouco tempo, mesmo que seja necessário chamar os tanques treinados nas favelas para aquietar distúrbios.

   A Globo decidiu que as manifestações não tem nome, nenhum partido as reivindica, porque são partidos muito partidos que apenas desejam fatias de poder e mais nada, e assim sendo os manifestantes não tem base política, no máximo são pessoas com idéias muito aleatórias sobre a vida, que não conhecem ainda o estupendo mundo dos conchavos e acordos, mas é esperado que cresçam para a realidade do capital.

   A Globo decidiu que é necessário, muito necessário que esses movimentos tenham representantes vinculados ao poder e ao despudor e não será improvável que muitos políticos devidamente instruídos na arte de enganar pessoas e modificar comportamentos participem das próximas manifestações, talvez até o Lula, o FHC, a Dilma e o Aécio gritando: “Abaixo nós!” – para gáudio dos eleitores empedernidos e acostumados ao jugo e à tutela.

segunda-feira, 17 de junho de 2013

A DITADURA É ASSIM


São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Brasília, Santos, Belo Horizonte, Curitiba, Salvador, onde mais? O Brasil de Dilma está acabando. Passeatas. Durante a ditadura oficial foi assim. Ou não tanto como agora. Restringiam-se mais a São Paulo e Rio, com todo o apoio da mídia do sistema que desejava tirar a farda dos governantes e fingir de democracia. Nas eleições indiretas o vice Sarney conseguiu ser Presidente devido à estranha e providencial morte de Tancredo Neves, que não era muito confiável. Pior que isso: pertencia ao PTB de verdade que, na época, se travestia de MDB.

   Nas eleições diretas, a Globo elegeu o Collor e quando achou necessário o apeou do poder com uma passeata fabricada em estúdio, apelidada de “caras-pintadas”. Depois veio o Itamar – lembram dele? E o Fernando Henrique, em 1995, ano em que o TSE criou a máquina de votar, apelidada de urna eletrônica. Mais segura para os donos do poder, posto que mais fácil de fraudar.

   O grande medo sempre foi o povo. Em 1996 1/3 do eleitorado, cerca de 35 milhões de pessoas, votou nas urnas eletrônicas sem comprovante do voto conferido pelo eleitor. Em 1998 foram 2/3 dos eleitores e em 2000, 100%. Em 1999 surgiu no Senado o primeiro projeto de lei que obrigava as máquinas (urnas eletrônicas) a imprimir o voto para conferência do eleitor, criava a auditoria estatística de 3% das urnas a serem sorteadas depois da eleição, impedia a identificação do eleitor na mesma máquina onde fosse votar e obrigava o uso de software aberto nas urnas eletrônicas.

   Pra quê! Imediatamente os juízes ministros do Superior Tribunal Eleitoral exerceram forte lobby no Congresso Nacional e conseguiram, em apenas dois dias de 2001, 7 emendas ao projeto original com o objetivo de cegar novamente o eleitor.

- Foi adiada a aplicação do voto impresso para conferência do eleitor para 2004.
- Mandava sortear as urnas a serem auditadas antes das eleições.
- Permitia a identificação do eleitor na máquina de votar.
- Permitia ao TSE usar programas de computador fechados dentro das urnas eletrônicas, cujo código-fonte não são apresentados aos fiscais.

   Esta é a transparência da nova democracia brasileira. A democracia deles. Passaram a lenda de que democracia é sinônimo de votos, de eleições. A participação do povo termina nas urnas. Eletrônicas e fraudáveis. Eles dizem: “Se você votou está numa democracia”. Você retruca: - “Eu quero conferir o meu voto”. Impossível.

   Então você protesta. Não só porque desconfia das urnas eletrônicas, mas pela bandalheira, pela corrupção em todos os níveis, pela inflação, pela cultura do roubo, pelo uso do dinheiro público na construção de gigantescos estádios. Dinheiro que deveria ser usado na educação, que eles jogaram na lata de lixo; na saúde, que só existe para quem pode pagar; na reforma agrária, que foi deixada de lado; nos cuidados com o povo de um país cujo território está sendo desmatado e desertificado sofregamente, destruído pelas multinacionais aliadas do poder.

   Você protesta porque está sendo roubado diariamente e os seus representantes nada fazem porque deixam de ser representantes depois de eleitos. Protesta contra os assassinatos de indígenas, contra a construção de hidrelétricas devastadoras, contra a impunidade e, principalmente, contra a hipocrisia dos que desejam que você continue como o palhaço que bebe novelas e come futebol e informações pasteurizadas.

   Você protesta contra a seleção de futebol formada pelos milionários que desejam o seu aplauso para ficarem ainda mais ricos e desdenhosos do povo.

   Sai ás ruas gritando “Não!” e a “democracia” joga em cima de você os seus cães amestrados e fardados, ferindo-o com cassetetes, balas de borracha, gás de mostarda, gás lacrimogêneo - todas as armas disponíveis para serem usadas contra o povo, aperfeiçoadas desde a época da ditadura oficial para conter manifestações verdadeiramente democráticas.

   Você protesta, é esbordoado, reage e a mídia oficial o chama de vândalo e anarquista. Você não pode protestar nesta democracia que só lhe permite o direito de votar. Você pode fazer passeatas e manifestações desde que sejam por direitos das minorias, nunca afetando a ganância do sistema.

   No sábado, Dilma foi vaiada estrondosamente no estádio Mané Garrincha, em Brasília, e o presidente da FIFA pediu ‘fair play’ para o povo. É claro, senhor Blatter, vamos deixar a bola rolar, não é assim? Talvez seja o caso de gritar: “Os que são roubados e massacrados te saúdam?”

   Atos em apoio aos protestos no Brasil estão acontecendo no mundo inteiro. Ontem, domingo, centenas de pessoas se reuniram em Berlim, na Alemanha e em Dublin, na Irlanda. Nesta segunda-feira, novos atos em Boston, Montreal e em outras cidades da Europa e da América Latina.

   Aqui, sob o lema “A luta se nacionalizou” novos protestos devem acontecer nesta segunda-feira e pelo resto da semana, em cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Campinas, Florianópolis, Cascavel, Belém, Vitória, Niterói e Sorocaba, entre outras. A Primavera brasileira começou no fim do outono. Ainda há vida no povo.

quarta-feira, 12 de junho de 2013

O DEBOCHADO GOVERNO


“O quilo do tomate está C$6,50 o quilo”, reclamou Silvio Antônio no seu programa “Ronda Gaúcha” da Rádio Cultura de Bagé, em 11 de junho de 2013. O melhor programa de música gaúcha destes pagos, principalmente se levarmos em conta que o radialista não se esquiva de dizer algumas verdades, como acontece em outros programas do gênero, e tem bom gosto musical, entremeando milongas com boas vaneiras e chamamés, uma que outra vez uma rancheira e evitando aquele ritmo choroso que alguns chamam de “nhé-nhéc” e que fez a glória de alguns compositores de tacanha inspiração.

   Não só o quilo do tomate. Tudo está mais caro. Ficou muito difícil viver neste país. Não somente aqui na República Rio-Grandense, dominada por pelegos ligados a Brasília. Também no restante da República Federativa do Brasil, que é, na verdade, a república do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais & estados associados. Ou escravizados.

   O Governo mente uma inflação de 6% quando todos percebem que está mais de 30%. E subindo. É um governo debochado, que condena e não prende e, quando prende, paga ao prisioneiro, atribuindo implicitamente a culpa da prisão, ou do crime que levou à prisão, ao Estado.

   “Enquanto os garis “ralam” por salários modestos, sem eles voltariam as pestes medievais, o auxilio reclusão mensal – livre de descontos para o INSS e Imposto de Renda – está em torno de R$ 1.000,00 (um mil reais). Ao delinquir, os “beneficiários”, por lei, recebem a ajuda. O Brasil é o único país onde cometer crime gera direitos. Direito a receber auxílio reclusão” – escreveu o jornalista Mario Sussmann, em 24 de maio no Em Tempo On-Line. E o dinheiro é nosso, dos impostos que pagamos, direta ou indiretamente, ao Governo que tem o despudor de exibir um Impostômetro.

   Pagamos impostos em cada tomate consumido para o Governo construir estádios que custam 20 bilhões de reais. Eles têm o dinheiro e a polícia, que costuma ser cega, muda e surda e ataca manifestantes que reclamam direitos. Verdadeiros robôs fardados. Este é o Brasil que já foi pra frente e um dia voltou sobre seus passos para instituir a ditadura civil dos debochados. E chamam isso de democracia.

   “Temos partidos de mentirinha. Nós não nos identificamos com partidos que nos representam no Congresso. Nem tampouco esses partidos e seus lideres tem interesse em ter consistência programática ou ideológica. Querem o poder pelo poder” – disse o presidente do STF, Joaquim Barbosa. Os políticos profissionais se sentiram ofendidos, mas é mentira? Qual a diferença entre PT, PSDB e outros pês? Talvez a sigla.

   "Somos o único caso de democracia no mundo que condenados por corrupção legislam contra os juízes que os condenaram. Somos o único caso de democracia no mundo em que as decisões do Supremo Tribunal podem ser mudadas por condenados. Somos o único caso de democracia no mundo em que deputados após condenados assumem cargos e afrontam o Judiciário. Somos o único caso de democracia no mundo em que, é possível, que condenados façam seus habeas corpus, ou legislem para mudar a lei e serem libertos." – afirmou Joaquim Barbosa sobre as tentativas do Congresso Nacional de controlar o Judiciário.

   Talvez sejamos o único país que se diz democrático cujo povo joga as suas últimas esperanças na honesta sinceridade de um juiz de direito. E em mais ninguém. Um povo que se acostumou a ser tutelado e deseja um salvador da pátria.

   Silvio Antônio diz que a erva-mate que ele toma está custando em torno de dez reais o quilo, porque está escrito no rótulo que é orgânica, não contém elementos transgênicos. Talvez.

   Na Hungria, o governo resolveu queimar todas as plantações feitas com sementes transgênicas da Monsanto. Você não vai encontrar essa informação na mídia que se diz “livre” e está presa a todas essas multinacionais, incluindo, provavelmente, a Monsanto. É uma imprensa livre para desinformar. Clique no site operamundi.uol.com.br, busque “Hungria” e encontrará: “A Hungria decidiu eliminar todas as plantações feitas com sementes transgênicas da Monsanto. De acordo com o ministro do Desenvolvimento Rural, Lajos Bognar, foram queimados nesta semana cerca de 500 hectares das lavouras de milho – equivalente a cinco milhões de metros quadrados. A intenção é que o país não tenha nenhum fruto com origem de material geneticamente modificado”. Não se surpreenda. Alguns países deste mundo ainda têm povos dignos.

   Sabem sobre as grandes manifestações na Grécia, em Portugal, na Espanha, ocasionalmente Irlanda, Itália e França? Não? Entendo. A auto-intitulada grande imprensa deixou de noticiar a respeito. Não é bom para os negócios. Deles. O nosso povo não é massificado: é futebolizado, novelizado e adora receber mesadas para votar em corruptos.

   “Povo que não tem virtude acaba por ser escravo”, diz o hino da desprezada e tripudiada República Rio-Grandense que planta milhares de hectares de produtos transgênicos.

   Não todo o povo desta república. Um pequeno grupo de fazendeiros, também autores conscientes da desertificação do solo. Chimangos da pior espécie, que chamam o país dos gaúchos de província - vejam só! A maior parte desta nação ainda acredita no respeito, no amor à pátria, nas tradições, no orgulho próprio do gaúcho. Em valores que não tem preço. A maior parte. Não temos culpa se, vez por outra, surgem “duplas sertanejas” por aqui. Ou “rock gaudério”. Entendemos que é gente sem raízes que quer ganhar dinheiro e fazemos gosto se eles se desenraizarem de vez. São como sementes híbridas transgênicas.

   Os que desejam a terra para os seus legítimos donos e não se rendem, não aceitam qualquer esmola e vão à luta como os indígenas, estão sendo massacrados. E isto a imprensa dos latifundiários não veicula.

   Um documento encontrado em meio ao acervo do Museu do Indio, com mais de 7.000 páginas, descreve episódios de assassinatos em massa, abuso sexual, escravidão e roubo de terras contra tribos do norte do país. Nos anos ‘60. Na época da elaboração do relatório, 134 funcionários do antigo Serviço de Proteção ao Indio (hoje FUNAI) foram acusados de mais de 1.000 crimes, e 38 foram demitidos. Nenhum deles foi preso.

   Isso se passou a mais de 40 anos e o relatório foi encaminhado para a risível Comissão da Verdade, que está se especializando em coletar documentos e pertence, em sua maioria, ao governo que hoje faz o possível para acabar com o que restou dos índios no Brasil, principalmente através da mineração e da construção de reservas hidrelétricas em terras indígenas.

   Os assassinatos de indígenas – de acordo com o Conselho Indigenista Missionário (CIMI) – cresceu 269% nos governos Lula e Dilma, em relação ao governo de oito anos de Fernando Henrique Cardoso. No governo FHC foram registrados 167 assassinatos de indígenas, média de 20,8 mortes por ano. No governo Lula, o número aumentou para 452 assassinatos, 56,5 em média por ano, ou crescimento de 271%. No primeiro ano do governo Dilma foram assassinados 51 indígenas e em 2012 mais 57 mortes. De acordo com a Comissão Pastoral da Terra, média de 54 mortes por ano, próxima aos oito anos do governo Lula e superior ao governo de FHC em 260%.

   É um governo debochado que constrói Belo Monte e outras indústrias da morte e se diz muito preocupado com a miséria do povo. Dilma, que acrescentou ao seu ‘dilmês’ as palavras, ‘negocial’ e ‘negociais’, sobre a morte do índio terena Oziel Gabriel saiu-se com a brilhante frase: “Sabemos o erro que foi essa desgraça dessa morte desse companheiro terena”. Matar índio é um erro; matar branco é crime. Para “negociar” com os índios ela envia a polícia e a Força Nacional. O extremo do deboche.

   Por aqui, fronteira com o Uruguai, depois de quase treze anos (treze!) de brincadeiras com o povo, promessas eleitoreiras que incluem a construção de mais uma barragem para o povo desta terra que sofre com a seca desde que transformaram as verdes coxilhas em reconhecido deserto verde, a Polícia Federal finalmente está agindo. Fraudes nas licitações das empresas construtoras da barragem. Parou o que já estava parado e adivinhem se vão achar algum culpado...

terça-feira, 4 de junho de 2013

RUMINANTES







A ilusória idéia do Estado protetor cai por terra todos os dias neste Brasil de sonhos destruídos e orfandade do cidadão. 


Acostumamo-nos, provavelmente por hábito ancestral, a acreditar que as instituições governamentais existem para defender as pessoas. Erro, estultice, crença cega, superstição ou necessidade de amparo que substituiu a luta pelos direitos mais básicos do ser humano pelo repasse dessa força que deveria ser transformadora para um ente abstrato - autor e responsável por todos os males que afligem a nação dos deserdados. E medrosos.

      Em algum momento da nossa maltratada História perdemos a força de vida. Tornamo-nos rebanho. Domesticados, desejamos as migalhas da mesa dos poderosos e as ações permitidas como esmolas às nossas estilhaçadas consciências de animais urbanos não passam de histriônicos gemidos pela necessidade de usufruir prazeres e sensações que nos entorpecem ainda mais. Somos a piada de um mundo que se tornou piada das suas misérias.

    Restou-nos o grito de “gol!”, suprema alegria da mediocridade. Todos os dias nos roubam. Todos os dias sugam um pouco do nosso sangue morno. Todos os dias o vampiro nos mostra os seus dentes para que possamos rir da sua corrompida dentadura.

  Quando exercem o seu poder contaminado, pervertido, e matam os pobres de todas as cores e etnias em demonstração da força que a eles concedemos nas cegas urnas virtuais, nos limitamos a protestos na internet – revelação da nossa fraqueza. Quando matam os que não são pobres fazemos tímidas passeatas.

     Quando desmatam, trucidam, arrasam a terra que deveria ser nossa, nos limitamos a protestos na internet – confessionário da nossa impotência. Quando os seus esbirros chafurdam nos nossos quintais, contratamos solenes e sentenciosos causídicos que os defendem habilmente.

    Estamos nos acostumando a aceitar o logro como parte da nossa natureza de logrados; o engano como hábito dos enganados; a trapaça como destino dos trapaceados. Acolhemos a corrupção com a naturalidade dos corrompidos. Não nos envergonhamos mais da nossa nudez moral. Não ousamos ir além dos limites estabelecidos aos ruminantes.


     No máximo, clamamos. Por saúde, educação, segurança; contra a fome, a sede, os desmandos, os abusos, a corrupção... Clamamos por hábito, para escutar as nossas roucas vozes, como bois mugindo na hora do abate. Pacíficos clamores. Agitados clamores que não passam de clamores. Somos um povo pacato.
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