segunda-feira, 31 de março de 2014

FELIZ DIA DOS BOBOS!




Eles darão novo golpe quando acharem necessário. No caso de uma nova guerra fria, por exemplo. Ou se a Dilma, o Lula e o restante do PT não mais obedecerem à matriz norte-americana. A democracia brasileira pertence à classe média feicebuquiana, aos intelectuais pequeno-burgueses, aos oligarcas, fazendeiros, empresários, políticos e mentirosos em geral, porque é uma falsa democracia que se sustenta de suspeitos votos virtuais a cada dois anos e de muita propaganda vendendo a idéia de que democracia é a liberdade de consumir. 

   Por enquanto, PT, PSDB e similares, todos esses partidos que compraram o poder e dividem o bolo entre si tem-se mostrado muito comportados e obedientes. Dizem que liberdade é isso aí: a liberdade de ir e vir para ser assaltado. Acabou a ditadura? Qual ditadura? 

   Festejar o fim da ditadura fardada é uma grande hipocrisia. As torturas continuam em todas as delegacias, os presídios estão cheios e o povo está cercado nas vilas e favelas por forças policiais e pelas Forças Armadas. Criminaliza-se a pobreza e são soltos os políticos corruptos de todos os partidos, mesmo quando condenados. Somente oficialmente condenados. O véu da Justiça desceu dos olhos e agora tapa a boca da estátua. Há maior ditadura do que a ditadura da mentira? 

   Acabou a ditadura para os povos indígenas e para as populações pobres de todo o país? É ausência de ditadura construir Belo Monte, provocando a destruição de diversas etnias e da natureza? Há democracia quando existe miséria? Que democracia é esta que faz do sistema de ensino fator de riso e de escândalo? A democracia que promove a ignorância, o desrespeito e a imoralidade? Somos livres para chafurdar na inconsciência dos alienados? 

   Nesta democracia, o povo, em sua grande maioria, tem a liberdade de passar fome, a liberdade de pagar os maiores impostos do mundo e ouvir que temos um grande PIB. Para eles. A liberdade da desnutrição, a liberdade dos sem teto, a liberdade dos sem terra, a liberdade de contrair doenças, a liberdade das grandes filas no SUS, a liberdade da violência oficializada, a liberdade de comer produtos transgênicos, a liberdade do medo, a liberdade da desesperança, a liberdade da insegurança, a liberdade do desamparo, a liberdade da desigualdade, a liberdade de ouvir profissionais em demagogia – esta é a nossa democracia. 

   Feliz Dia dos Bobos!

sábado, 29 de março de 2014

SEU CHICO E A FORÇA DO POVO




- Diga-me, seu Chico, o Pútin recuou? 

- Antes de tudo, trata-se de um político, esta é que é a verdade! Depois, permanecer com as tropas ali na fronteira com a Ucrânia, gastando com alimentação e tudo o que o senhor possa imaginar, é contraproducente – como diria o próprio Pútin. Já fez a sua demonstração militar na Criméia, provou para o mundo que as Forças Armadas russas são muito fortes e coisa e tal, e agora está na hora das conversações. 

- É uma pena, seu Chico. Eu tenho lido comentários de muita gente que acha que a Rússia poderia ser uma alternativa ao império, e agora, com essas conversações políticas, como o senhor diz... 

- Só há uma alternativa ao império: a conscientização popular. No dia em que o povo decidir não beber mais aquele refrigerante venenoso que eu me nego a dizer o nome, não assistir mais aos filmes feitos por babacas e para babacas, dos Estados Unidos, não usar mais as roupas deles, os carros deles, os celulares deles, toda aquela parafernália de produtos que eles querem nos enfiar goela abaixo, como se fossem muito necessários... Nesse dia teremos alguma esperança de uma alternativa ao império, porque este é um império baseado no capital, no lucro, no consumo, na matéria e na absoluta falta de moral. 

- Isso é quase impossível, seu Chico! Imagine o nosso povo não querendo consumir, tão domesticado que está a aceitar qualquer propaganda como verdade incontestável... Tem gente que se endivida só para comprar um carro ou uma roupa de grife ou um daqueles aparelhinhos portáteis, e depois se queixam da vida, da inflação, mas querem aparentar, aparecer aos outros como alguém que tem o que a propaganda manda ter... 

- Materialistas! Esta é uma sociedade de materialistas e de zumbis programados para o consumo – o senhor há de concordar comigo. Salva-se pouca gente. Mas eu não me refiro à sociedade que já está viciada em porcarias e acredita que a vida é feita de chips, anteninhas e trocas de mensagens afetuosas. Cultura zero! Espiritualidade zero! E não entenda espiritualidade o fato de ir à igreja, ficar rezando, praticar ioga ou recitar mantras. É muito mais que isso. Antes de tudo trata-se de sentir a vida, agradecer pela beleza da natureza e lutar para que essa beleza não continue a ser destruída, adquirir consciência social e lutar pelas causas populares, porque só no povo está o poder de transformar a sociedade. 

- Mas no nosso povo, seu Chico! 

- Pois saiba que o nosso povo é surpreendente Assim como está assistindo a novelas ou a jogos de futebol, também está nas ruas exigindo os seus direitos. Chega um momento em que o povo não agüenta mais tanta desonestidade e começa a se dar conta de que a vida é muito séria. Não diziam que o povo da Índia era feito de alienados? Pois expulsaram os ingleses através da desobediência civil e o boicote a todos os produtos importados. 

- Gandhi? 

- Não somente Gandhi, mas toda a sociedade indu. Gandhi foi um dos líderes. Vivemos numa sociedade que adora criar ícones e que detesta reconhecer a união popular. O nosso povo pode, sim, fazer a sua revolução, e não são poucas as opressões que temos sofrido. Um decreto presidencial contra o povo não é opressivo? Um Congresso que legisla em causa própria não é uma vergonha que vemos todos os dias? Um Judiciário que decide de acordo com interesses, muitas vezes escusos, não é um descalabro e uma ofensa à própria Justiça? O povo está vendo tudo isso. E se organizando. 

- Eu não vejo essa organização. 

- Não vemos tanta coisa!... Mas voltando à vaca fria... O tal de Pútin, que um dia eu pensei que era gaúcho, pela valentia demonstrada... Ele também tem que prestar contas ao povo russo, cuidar dos seus interesses. E não é só ele: é o próprio povo que o elegeu e que o apóia quase totalmente que pede uma mudança nas relações internacionais, que não significa, necessariamente, uma guerra neste momento. De preferência, em nenhum momento. A Rússia é um exemplo pela cultura e pela coragem. Não foram eles que venceram a II Guerra Mundial? 

- É verdade, seu Chico. Embora digam que foi os Estados Unidos, que só se aproveitou do caos europeu para lá estacionar os seus exércitos. Enquanto isto, jogavam bombas atômicas nas cidades japonesas. 

- Com a tecnologia dos cientistas alemães, diga-se de passagem. A história da humanidade é uma sucessão de mentiras criadas pelos vencedores das guerras. O grande medo deles é do povo organizado – me acredite. Quanto aos donos do poder, aqueles que aparecem para as fotos, se não obedeceram à vontade do povo, cedo ou tarde serão esquecidos. 

- Mas ainda há uma possibilidade, seu Chico. Eu acredito. 

- Eu também. Eu acredito na força do povo. Dos povos do mundo inteiro.

segunda-feira, 24 de março de 2014

A GUERRA DELES E A ANEDOTA BRASIL


Uma a uma, as 189 instalações militares da Ucrânia situadas na península da Criméia foram tomadas por soldados russos. No sábado, a grande base aérea de Belbek, em Sebastopol, foi invadida, os soldados ucranianos rendidos e a a bandeira da Rússia substituiu a ucraniana. No mesmo dia, no ocidente da Criméia, outra base militar foi invadida por cerca de duzentas pessoas desarmadas. Um comunicado do Ministério da Defesa da Rússia afirma que "até 21 de março, dos mais de 18 mil militares das forças armadas da Ucrânia na Criméia, menos de dois mil manifestaram o desejo de serem enviados de volta para a Ucrânia". Os demais preferiram se incorporar às forças russas.

   Acredita-se que os 67 navios da Marinha ucraniana na Criméia, incluindo oito navios de guerra, estão sob controle dos russos. Ainda no sábado, 22, o único submarino da Ucrânia, o "Zaporizhia", que se encontrava numa baía perto de Sebastopol, foi cercado por navios russos e atacado com granadas de fumaça, que puseram em fuga alguns tripulantes. Os que ficaram decidiram servir às autoridades russas. O último navio de guerra a se render foi a nau capitânea da Marinha ucraniana "Slavutich", que içou a bandeira russa no domingo, 23. A 36ª brigada da Defesa Costeira da Ucrânia, estacionada na aldeia de Perevalnoe, em Simferopol, passou inteiramente para o lado russo. Mais de 400 homens, com armamentos e munições.

   Só após a derrota na Criméia as "autoridades" de Kiev  ordenaram a retirada das suas tropas, que tinham ordem de resistir e não o fizeram para evitar derramamento de sangue. Poucos estão voltando para a Ucrânia. Os militares queixam-se de abandono pelo ilegal governo ucraniano. O governo fascista ucraniano não sabe o que fazer e espera ajuda militar dos Estados Unidos e da OTAN. Em troca, entregará a Ucrânia para a União Européia, a patrocinadora do golpe de estado. O governo por procuração de Kiev transformou o "Setor de Direita", agrupamento fascista, em um partido político e a ele ofereceu 23 colônias de férias, que servirão como base de treinamento e preparação de uma nova Guarda Nacional - a SS ucraniana.

   Quando, no início de março, o governo dos Estados Unidos enviou o destróier USS Truxtlun para "manobras" no Mar Negro, este se viu imediatamente cercado por navios russos e ficou "manobrando" em círculos. Sistemas de mísseis anti-navios "Bastion", com um alcance efetivo de 300 quilômetros, foram instalados em terra sobre plataformas móveis à espera do primeiro sinal bélico do Truxtlun - agora o único navio de guerra estadunidense na região, uma vez que a fragata USS Taylor que já se encontrava no Mar Negro aparentemente sofreu problemas em uma das suas hélices e necessitou ser rebocada para Souda, em Creta, para reparos. A atrapalhação é tanta entre os ucranianos golpistas e seus aliados que um bombardeiro Su-24M, da força aérea ucraniana, destinado a ataques com bombas e mísseis, caiu no mar ao tomar a cabeceira da pista na região de Khmelnitsky. A tripulação foi catapultada e está bem.

   Fascistas e neonazistas dominam o suposto governo da Ucrânia, que se transformou em um espelho da realidade (semi) oculta dos Estados Unidos, Inglaterra, Espanha, Alemanha e França, países que fingem uma "democracia" muito privada, com base na divisão de classes, na desigualdade social, no racismo, na criminalização da pobreza, na privatização dos meios de produção e em uma visão de mundo grotesca, amparada pelo deus Mercado.

    Contam-se anedotas. Obama estaria discutindo com a sua bela esposa, quando ela exclamou: "Até os russos, Barack, até os russos!" Assustado, ele olhou em volta e gritou: "Aonde? Chama os guarda-costas!" Nas últimas semanas, dois em cada três norte-americanos acordam gritando: "Os russos estão chegando!" e só ficam mais calmos depois que são colocados em frente aos televisores ligados e começam a assistir "A Família Simpson". Jovens dos Estados Unidos e da Europa estariam dispostos a partir para a guerra contra a Rússia, desde que não sejam obrigados a sair da frente dos computadores. Deram-lhes a guerra cibernética e agora eles invadem sites de Moscou.

    Coisa de brasileiro, que gosta de fazer anedotas até com a própria miséria. Aqui, os barracões no morro são idealizados como pontos turísticos, onde os moradores rezam "Ave-Maria" quando o morro escurece. Talvez pedindo para não serem mortos pelas tropas de choque da polícia.

    Qual a posição do Governo brasileiro frente ao que apelidaram de "crise na Ucrânia"? Notícia da Agência Brasil (agenciabrasil.ebc.com.br) de 19/03/2014: "O ministro das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo, disse que o Brasil lamenta qualquer tipo de violência e defende uma solução negociada para a Criméia, que respeite o povo e a vontade dos ucranianos". Portanto, o Brasil (leia-se Governo brasileiro, e não o povo) está ao lado da Ucrânia fascista e, obviamente, contra a Rússia. No dia 19, quando o ministro Figueiredo fez a declaração, a Criméia não pertencia mais à Ucrânia e sim à Rússia. Ficou muito constrangedor para o PT, que se diz de "esquerda", apoiar um Estado fascista. O muro onde ficam os neutros sempre desaba para o lado dos mais fortes.

    Dilma não sabe o que fazer ou o que dizer a respeito. É um governo sem vontade própria, sem personalidade. Veja-se a Cristina Kirchner. No primeiro momento, defendeu a Criméia independente. Assim como os governos de países como China, Índia, Síria, Irã, África do Sul, Bielorússia, Sérvia e muitos países da América Latina.

    O Brasil? O Brasil de Dilma e do PT têm muitos interesses econômicos e políticos com União Européia e Estados Unidos. São parceiros estratégicos. Embora pertença ao grupo dos países emergentes, o BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), a emergência brasileira continua muito dependente da América do Norte e da Europa. O nosso é um governo que não têm idéias próprias, posicionamento político. Vai conforme o vento. Ou os negócios. Está muito comprometido com o neoliberalismo semi-feudal. Um governo sem... como direi?... Afinal, qual é o feminino de hombridade?

    A grande preocupação do governo brasileiro é com a Copa do Mundo. É um governo ideologicamente futebolizado. Já mandou evacuar favelas para inglês não ver. Agora, está enviando soldados para muito perto do povo marginalizado. Rússia, Estados Unidos, União Européia... Quem dá mais? O Brasil está virando uma grande anedota.

domingo, 16 de março de 2014

PRIMAVERA NA CRIMÉIA... E NO VÊNETO




A extrema hipocrisia dos países liderados por Inglaterra, Alemanha e Estados Unidos faz com que a mídia ocidental coloque a Rússia como a grande infratora dos direitos internacionais devido ao referendo que deu à Criméia a possibilidade de voltar a unir-se com a Rússia e desligar-se definitivamente da Ucrânia – um país atualmente governado por fascistas que tomaram o poder através de um golpe de estado apoiado pela União Européia e pelos Estados Unidos. 

No entanto, no mesmo dia 16 de março de 2014 outro referendo por independência ocorreu na região do Vêneto (região administrativa da Itália que engloba 7 províncias, incluindo Veneza, Verona e Pádua) e cerca de 65% da população da região apóia a sua separação da Itália. Segundo a lógica dos organizadores do referendo, como a região integrou outrora a Itália por referendo, é igualmente por referendo que ela pode se separar da Itália. O referendo terá uma votação complementar via internet no dia 21 de março, e não se sabe exatamente qual será a reação do governo da Itália no caso de ser declarada a independência do Vêneto.

O Partido Nacional Vêneto (Partìo Nasionàl Vèneto em vêneto, Partito Nazionale Veneto em italiano) é um partido independentista. Na manhã do dia 9 de maio de 2013, oito pessoas tomaram um "vaporetto" no Grande Canal e obrigaram o piloto a levá-las até a praça de San Marco. No principal ponto turístico de Veneza, desembarcaram e tomaram o campanário da basílica. Do alto declararam: "Depois de 200 anos, uma unidade regular do Exército da Sereníssima República libertou a praça de San Marco". Entregaram-se após cinco horas. Segundo eles, o Vêneto está sob domínio estrangeiro desde 12 de maio de 1797, quando Napoleão Bonaparte derrotou a outrora poderosa república. Depois dos franceses, foi a vez de os austríacos controlarem a cidade, seguidos pela unificação italiana, ou, como preferem os separatistas, submissão a Roma.

Submissão é o que sofre a Escócia, obrigada a pertencer ao Reino Unido (Inglaterra, Irlanda do Norte, Escócia e País de Gales), a curvar-se ante a casa real inglesa e a pagar mais impostos que o resto da Grã-Bretanha nos últimos 32 anos, segundo o primeiro-ministro da Escócia, Alex Salmond, um dos defensores do referendo pela independência da Escócia, que acontecerá em 18 de setembro de 2014. Um referendo que dificilmente alcançará o seu objetivo: a Inglaterra não admitiria que saíssem de suas mãos as maiores reservas de petróleo da União Européia, localizadas no mar territorial adjacente à Escócia, no Atlântico Norte e no Mar do Norte. 

O mesmo acontece com a Catalunha, que buscará a sua independência da Espanha em um referendo anunciado para 9 de novembro de 2014. Região de grandes indústrias, bancos, portos, aeroportos, além de ser o principal ponto turístico da Espanha, ainda que tenha história, cultura, língua própria e direito civil, mesmo que o “sim” venha a ser majoritário no próximo referendo, o povo catalão não obterá “licença” da Espanha para se tornar independente.

Na Criméia, mais de 90% dos eleitores escolheram a união com a Rússia. As minorias tártaras e ucranianas tentaram boicotar o referendo; mesmo assim, 80% dos habilitados a votar compareceram às urnas. Em 1954, Nikita Kruschev deu a Criméia à Ucrânia que, então, fazia parte da União Soviética. Agora, a Criméia volta a pertencer ao território russo - para eterna ira dos países da União Européia que promoveram o golpe fascista na Ucrânia. Obama está desmoralizado e o povo norte-americano, que acredita em tudo o que a sua mídia diz, não consegue entender o que está acontecendo.

O máximo que os Estados Unidos e a OTAN podem tentar, a partir de agora, é promover uma guerra de desgaste na Ucrânia, mas as lições da derrota na Geórgia durante a guerra dos cinco dias em 2008 farão com que os donos do império pensem várias vezes antes de deflagrar uma guerra contra a Rússia. Além disso, não é provável que agrade aos Estados Unidos e seus aliados europeus a perspectiva de abrir várias frentes de batalha ao mesmo tempo, em lugares como Síria, Líbano, Irã, Coréia do Norte e Ucrânia – e a tentativa de golpe de estado na Venezuela.

Sanções econômicas contra a Rússia poderão e deverão acontecer, para tentar salvar os brios imperialistas. Mas a Europa falida depende em mais de 30% do gás e óleo proveniente da Rússia, e por mais irados que os países europeus fiquem com a derrota política na Criméia, por mais desmoralizado que o Obama esteja, os aliados do mundo ocidental tentarão outras maneiras para estrangular a Rússia.

Uma delas é a velha estratégia do cerco aparentemente pacífico. Anunciam-se bases militares na Turquia e na Polônia. Talvez na Romênia. Moldávia e Geórgia poderão ser admitidas na OTAN e a questão da Transnistría – que se tornou independente da Moldávia em 1990 com apoio da Rússia – poderá ser reaberta. O mesmo em relação à Ossétia do Sul e Abkhásia, que se tornaram independentes da Geórgia durante a guerra dos cinco dias, vencida pela Rússia, em 2008.  

Percebe-se, entretanto, que a Rússia tem tomado providências contra essa provável tentativa de “cerco”. O governo russo tem enviado tropas para lugares estratégicos dentro e fora do seu território e, nos últimos dias, cerca de 400 soldados e armamentos que incluem mísseis e artilharia foram desembarcados no Ártico, numa clara alusão a um possível ataque direto aos Estados Unidos e Canadá, em caso de guerra generalizada. 

Não é bom, para os que se consideram donos do mundo, provocar essa guerra. Em caso de vitória, seriam donos de escombros. Deveriam se preocupar, em primeiro lugar, em arrumar as suas casas. A recessão européia é uma realidade e ameaça claramente os Estados Unidos. Bravatas políticas, como o golpe de estado na Ucrânia, devem ser deixadas de lado, porque só podem ser sustentadas com um bom exército, o que implicaria no risco de uma guerra atômica. 

É primavera, verdadeira primavera na Criméia, que voltou a ser russa. Talvez também na região do Vêneto. Se a Itália deixar. Não se pode parar a História, fixá-la num determinado ponto, como um alvo morto e estático a ser desfrutado por abutres. Assim como a vida, a História é dinâmica e as transformações que podem parecer surpreendentes para cansados espectadores, revelam esse dinamismo, resultado da luta dos povos pela liberdade e autodeterminação. Apesar dos abutres, como disse “La Pasionária”: “Para viver de joelhos é melhor morrer de pé!”.

sexta-feira, 14 de março de 2014

CONVERSA COM O LADRÃO




Estava encolhido na sacada, molhado, olhos imensos no escuro. Chovia bastante desde o último apocalipse. Perguntei “quem és” e ele me respondeu, entre uma e outra tosse, “sou o ladrão”.

        - Qual deles?
   - Aquele que assaltou esta casa na semana passada.
        - Qual deles?
        - Eu.

      A chuva aumentou, devoradora, e ele me pediu “posso entrar, nem que seja só por um momento, acho que peguei uma gripe”. Não era alto ou baixo, forte ou fraco, branco ou negro. Tinha olhos vermelhos e tossia.

        - Entrega a arma.
        - Não estou armado.
        - Como posso confiar?
        - Não pode.

       “Não se pode confiar em ninguém hoje em dia”, confidenciou, enquanto pedia licença e entrava, pinga-pingando grandes gotas da roupa molhada. Espirrou. Em voz pedinte, sugeriu: “quem sabe um café? Se tiver uma aspirina...”

        - E um agasalho?
        - Pode ser. O problema da chuva é que molha.
        - As plantas não reclamam.
        - Nem o deserto.

        Um ladrão filosófico. Fiz o café e dei o agasalho e a aspirina. Sério, muito sério, perguntei: “e as coisas que me roubaste?” “Passei adiante.” Bebia o café com desespero. Continuou, gaguejando: “esta é uma cidade de receptadores, receptores, replicadores...”

        - Resmungadores também?
        - Muitos resmungam o dia inteiro. Eu assalto.
        - E não tem vergonha?
     - Costumo assaltar vestido. Desta vez a roupa molhou.

       Disse que não era pobre ou rico, remediado ou assistido. Somente um ladrão entre tantos, ainda em fase de aprendizado. Não era do PT ou do PSDB. Votava no candidato da moda, aquele que pagasse mais, e admirava muito os políticos.

       - Todos?
       - Todos. Não escapa um. São especialistas.
       - Especialistas em...
       - Exato. Admiráveis exemplos.

     Pretendia seguir carreira na política, quando estivesse cansado de tantos assaltos. “Não é uma questão de ideologia, mas de pragmatismo”, afirmou. Nas horas vagas, fazia um curso on-line de vendedor. Admitiu que necessitava muito de um pouco de teoria. Já não tossia ou espirrava e exibia um olhar rapínico. Fiz algumas sugestões.

    - Quem sabe uma empresa de marketing?
    - Tenho pensado nisso, mas há muita concorrência.
    - Tesoureiro de partido político?
    - É o meu grande sonho!

       Estava refeito, os olhos brilhando. Levantou-se e começou a olhar para os lados. Viu o relógio-cuco e disse: “deve custar uma fortuna!” “É uma herança, tem valor estimativo. A chuva parou; deves ir embora ou chamo a polícia.” “Polícia? Tenho alguns conhecidos.”

       - Eu estou armado.
       - Como posso ter certeza?
       - Não pode. Sabe, hoje em dia...
       - Não se pode confiar em ninguém!

        Falei para ele que não estava gostando das suas frases exclamativas. Preferia o cara molhado e gaguejante que se queixava da chuva e que estava encolhido na sacada quando eu ouvi barulho e o encontrei. “As coisas mudam”, replicou, “assim como a chuva precede e sucede o sol”. Tentava me enrolar com a sua conversa de futuro vendedor. Ou político. Percebi, e disse a ele que deveria sair imediatamente.

       - Por onde? Portas e janelas estão trancadas.
       - Por onde entraste.
       - Ainda está muito úmido.
       - Logo estará seco. As coisas mudam.

       Acompanhei-o até a sacada. Ao lado, mais abaixo, havia o muro de uma construção. “Entraste por ali, não foi?” Mostrava-se nervoso, quase não acreditando que eu o estava expulsando. Subiu na grade da sacada e estava quase alcançando o muro, quando voltou e tentou me atacar. Esquivei-me e mostrei a arma. Retrocedeu.

      - Não vai atirar em mim. Seria um crime.
      - Em legítima defesa.
   - Isso é bobagem. Leis... Além disso, matar é pecado.
     - Pecado é a tua vocação para político profissional.
  
     Atirei.
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