“O povo não está bem informado, é manipulado
durante as 24 horas. Já faz anos que não vejo televisão e me informo pelas
mídias alternativas.” (Lagarder Danciu, ativista romeno).
Há
uma incrível desatenção quanto à situação política atual naqueles grupos que se
denominam “de esquerda”, e é sabido que ser de esquerda, hoje, não significa
adesão ao marxismo, mas um modo de pensar que muitas vezes leva a conciliação
com as classes dominantes, atrasa as lutas populares, reage contra qualquer
tentativa de mudança e se limita a propor pequenas melhorias que em nada
alterarão a realidade social, ao contrário, postergarão os problemas mais
profundos para uma data indefinida e muito distante.
Esses
grupos, que em geral se traduzem por partidos políticos com diferentes siglas e
denominações, em pleno processo golpista estão muito preocupados com as eleições
municipais. Agem como se nada estivesse acontecendo, talvez acreditando que o
golpe é passageiro, como uma doença infantil que tem seus dias contados para
acabar, e não é improvável que pensem que com a realização de eleições tudo se
arranjará - como a abóbora que se transforma em carruagem encantada e depois,
quando volta a ser abóbora, provoca desapontamento naqueles que desejariam a
eternidade da ilusão.
Passam
as eleições, ou as ilusões, e acontece o quê? O golpe continuará impávido e
colosso. Quem sabe acreditam que o golpe é um único momento dividido em duas
partes: as votações pelo impedimento de Dilma na Câmara e no Senado? Ou, ainda,
talvez imaginem que o golpe se restringe à deposição de Dilma e que poderá ser
revertido com uma nova votação no Senado que a faça retornar ao governo? Se for
assim, é o supra-sumo da ingenuidade ou da canalhice. Quero acreditar que é
ingenuidade, a canalhice eu deixo para os grupos de direita.
O
golpe começou com a própria Dilma, em 2015, ao mandar para o Congresso as leis
de ajuste fiscal contra os trabalhadores e a lei antiterror contra os
movimentos sociais. Ou o golpe contra o povo brasileiro teve início antes de
2015, quando Dilma cedeu aos latifundiários o novo Código Florestal, que
aumentou o desmatamento e perdoou os infratores, e quando Dilma pactuou com as
grandes empresas para fazer a usina hidrelétrica de Belo Monte abandonando os
povos indígenas ao massacre dos ruralistas e causando um impacto ambiental e
social gigantesco, talvez irreversível. Este ano (2016), Dilma foi afastada,
talvez momentaneamente, para que Temer & Comparsas possam aperfeiçoar o
golpe. E entregar as nossas riquezas para o capital estrangeiro.
Ou
melhor, o golpe aconteceu em 1964 e ainda não terminou. O que houve nos anos
1980 foi um acordo político para a volta das eleições diretas, dando a entender
ao povo menos instruído que eleições são sinônimos de democracia ampla, geral e
irrestrita. Mais da metade do povo brasileiro continua menos instruído, com um alto índice de analfabetismo funcional –
pessoas que sabem ler, mas não conseguem interpretar o que estão lendo. E hoje
temos tiriricas, ex-jogadores de futebol e zezinhos das couves “representando”
o povo no Congresso Nacional. Todos eles facilmente manipuláveis pelas mídias golpistas,
direitistas, entreguistas.
Quem
votou nesse pessoal? A população desiludida que sabe, intuitivamente, que
eleições de nada adiantam, acreditando que tanto faz votar num palhaço como num
bacharel: todos roubam. Então, prefere votar em palhaços, fazendo das eleições
um brinquedo, uma mentirinha. Dilma falou que houve uma ruptura do pacto
social. Que bom! Já era tempo de desmascarar o pacto feito entre a burguesia e
a esquerda pequeno-burguesa do PT e similares. Acordos políticos, pactos,
alianças não funcionam mais. A direita deu o mote: só aceita o governo de um
partido de centro-esquerda (ou centro-direita, se preferirem) como o PT se este
fizer amplas alianças com partidos conservadores. E mesmo neste caso, quando se
trata de vender as nossas riquezas e arrochar o trabalhador, tira-se o governo
vestido de vermelho e coloca-se um governo vestido de azul para cumprir a
missão de sucatear o Brasil.
No
final dos anos ’80, sob os auspícios do general Golbery, a rede Globo comandou
o chamado à volta das eleições gerais, dando grande destaque a políticos como
Tancredo Neves (um dos que traíram Getúlio Vargas, em 1954), ajudando a
promover passeatas civilistas, ocasiões em que seus artistas desfilavam nas
grandes capitais gritando por diretas já. O muro de Berlim era derrubado, a
União Soviética desmoronava com a ajuda do traidor Gorbachev, Bush anunciava
uma nova ordem mundial e os países que davam sustentação ao império na América Latina
deveriam mostrar-se oficialmente democráticos.
O
acordo previa anistia mútua: para os civis perseguidos e para os militares assassinos
e torturadores. Tudo deveria ficar exatamente como estava. A única diferença é
que partidos políticos poderiam arvorar suas bandeiras e concorrer às eleições,
se assim desejassem. Ainda: os governos eleitos deveriam seguir a linha
capitalista, o neoliberalismo econômico, no máximo algumas reformas aqui e ali,
pequenas benfeitorias para a população miserável. Socialismo nem pensar, só nas
siglas partidárias. Ao povo, carnaval, futebol e eleições até se fartar. A
democracia concedida por eles deveria ser uma embriagante e alienante festa.
Este, em poucas linhas, foi o pacto social, o pacto entre elites políticas, que
Dilma reclama ter sido rompido com o seu impedimento.
O
que é ótimo. A ruptura política mostra quem é quem e não deixa ninguém de fora.
Todos são reacionários interessados apenas nos seus próprios ganhos, políticos
que fazem da política uma profissão muito rendosa, especialistas em acordos e
tramóias, corruptos pela própria natureza. O sistema representativo morreu. Votar
em um representante é delegar poderes a um desconhecido que logo irá se vender
pela melhor oferta. Eleições? Fartem-se dessa farsa os porcos que comem bolotas
pensando que são pérolas.
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