sexta-feira, 24 de agosto de 2012

A HERANÇA DE GETÚLIO VARGAS


Nascido a 19 de abril de 1882, sentou praça aos 16 anos (1898), em São Borja, sua cidade natal. Com a patente de sargento, em 1902, participou da Coluna Expedicionária do Sul, que se deslocou para Corumbá, durante a disputa entre Bolívia e Brasil pela posse do Acre. Em 1904, matriculou-se na Faculdade Livre de Direito de Porto Alegre, atual UFRGS. Bacharelou-se em Direito em 1907. Trabalhou como promotor público junto ao Fórum de Porto Alegre, mas preferiu exercer a advocacia em sua cidade.

     Casou-se em 1910 com Darcy Lima Sarmanho, com quem teve cinco filhos. O casamento uniu as duas principais famílias rivais de São Borja. A família de Darcy era maragato (Federalista) e a de Getúlio chimango (do Partido Republicano Rio-Grandense). Foi eleito deputado estadual duas vezes, mas renunciou ao segundo mandato em protesto contra Borges de Medeiros.

     Foi ministro da Fazenda de Washington Luís, em 1926, implantando a reforma monetária e cambial daquele governo. Deixou o cargo, em 1927, para candidatar-se à presidência do Rio Grande do Sul. Elegeu-se presidente (governador) com um discurso de conciliação, substituindo a Borges de Medeiros. Em 1930, os dois partidos gaúchos – chimangos e maragatos – marcharam juntos para acabar com a República Velha. O Brasil começava a ser construído.

     A revolução teve início a 3 de outubro de 1930 e no dia 3 de novembro, Getúlio Vargas tomava posse no Palácio do Catete.

     No dia 26 do mesmo mês decretou a criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio. Depois, sucederam-se muitas medidas de proteção ao trabalhador, novas modalidades de concessão de férias. Em 21 de março de 1932, institui a Carteira Profissional do Trabalho, retirando os conflitos de patrões e empregados das delegacias de polícia. No documento constava a ocupação do trabalhador, seu salário e o direito de filiar-se a um sindicato, dados pessoais, representando o reconhecimento de sua cidadania. Regularizou o horário de trabalho do comércio e na indústria; regularizou as condições de trabalho das mulheres na indústria e no comércio; instituiu a Convenção Coletiva do Trabalho; disciplinou a condição de trabalho dos menores na indústria.

     Foi só o início. O gigante pela própria natureza erguia-se, assustando aqueles que sempre desejaram o Brasil deitado eternamente em berço esplêndido – talvez numa rede, como Macunaíma ou o Jeca Tatu. Para as demais realizações de Getúlio remeto o leitor a matéria deste blog - “GETÚLIO, UM BRASILEIRO” -  http://fausto-diogenes.blogspot.com.br/2011/08/getulio-um-brasileiro.html 

     A herança de Getúlio Vargas – o nacionalismo, também chamada de trabalhismo – foi golpeada em 1964, dez anos após a sua morte. Os militares que deram o golpe disseram que era um movimento revolucionário para salvar o Brasil do comunismo – provavelmente uma frase fabricada em Washington, durante o período de preparação do golpe militar, no pior momento da guerra fria entre Estados Unidos e aliados contra União Soviética e aliados.

     Naquele tempo, o Brasil era governado por João Goulart, legítimo continuador das ideias de Vargas, que também eram as ideias de Perón, na Argentina, e de muitos outros chefes políticos mundo afora, que não se alinhavam com nenhum dos dois imperialismos e procuravam uma terceira via independente.

     Já previam os ideólogos do imperialismo norte-americano que, a continuar assim, o Brasil - e muitos outros países do Terceiro Mundo – estava a encontrar um caminho muito distante da prescrição liberal “democrata”, que deseja o Estado como um gerente das multinacionais que o governam e não como o defensor do seu povo e das riquezas naturais do país.

     Não lhes servia um Estado voltado para a nação e para o território nacional. Queriam uma nova “abertura dos portos”, uma entrega total às “aves de rapina” que Getúlio Vargas cita em sua carta-testamento. Atualmente, a rapina é muito grande, com os governos neoliberais que se sucedem, fazendo questão de entregar o Brasil, dilapidar o nosso patrimônio, devastar as nossas riquezas naturais e transformar o povo em uma grande massa de pessoas amestradas pela mídia vendida, tendo como única ideologia a do consumo pelo consumo. Um povo que perdeu a sua razão de ser e que é ensinado a não pensar.

     O nacionalismo getulista era de uma grande simplicidade. Em primeiro lugar as nacionalizações. Fundou e nacionalizou a Petrobrás e a Eletrobrás para dar sustentação energética ao país e para que o Brasil pudesse iniciar uma saudável industrialização, não somente baseada nos produtos de exportação (como o café, na época) ou na reprodução dos produtos estrangeiros. Getúlio desejava um empresariado forte e criativo que pudesse competir através de produtos genuinamente nacionais.

     Pagar royalties por serviços que podemos fazer e bens que podemos fabricar é sinal de subserviência. Pior ainda é receber royalties pela exploração dos nossos produtos.

     Ele entendia que o trabalhador deveria ser assistido pelo Estado e criou as leis trabalhistas , junto com o salário mínimo e a previdência social. Um trabalhador saudável e bem remunerado deveria ser o sustentáculo de um forte empresariado que moveria o aé então inexistente desenvolvimento do país. Não o assistencialismo, mas o reconhecimento da força do trabalho.

     Suas realizações foram combatidas desde o início, porque os empresários brasileiros preferiam – e ainda preferem – continuar atrelados ao capital estrangeiro; detestavam – e ainda detestam – o tabalhador organizado, porque o queriam escravizado.

     Getúlio Vargas propôs a independência verdadeira, não o estéril grito o Ipiranga. Eles protestaram e conspiraram até derrubar Getúlio, em 1945 e o obrigarem ao suicídio em 1954. Eles, os que o derrubaram e mataram, preferiam e ainda preferem agir como meretrizes sustentadas pelo cafetão norte-americano.

     Antes de 1964 – a data em que as aves de rapina atacaram –, quando do governo de João Goulart, o nacionalismo brasileiro procurava expandir-se. A reforma agrária estava sendo feita para que o trabalhador do campo ficasse no campo e não fosse aumentar os bolsões de miséria das grandes cidades. Era parte das reformas de base, que pretendiam dar o Brasil para os brasileiros.

     Darcy Ribeiro sonhava com um novo povo – forte, através da miscigenação, revigorado pela identificação das suas origens. Paulo Freire, ministro da Educação, começava a implantar o seu método de ensino revolucionário, que fazia do trabalhador não um autômato alienado, mas consciente e participante da própria realidade.

     Em 1964, com a desculpa de “combater o comunismo” – que nunca souberam exatamente o que significava – os militares brasileiros patrocinados por Wall Street e custodiados pela IV Frota dos Estados Unidos tomaram o poder no Brasil. O nacionalismo brasileiro era demasiado brasileiro, necessitava de um pouco de internacionalismo, de uma boa dose de globalização.

     Depois da “abertura política” – na realidade, um pacto entre as elites conservadoras e as nem tanto com os militares – sucederam-se os governos entreguistas com presidentes civis. Quando chegou ao poder, o PT já era um partido da direita festiva travestida de esquerdismo moderado. O PTB, partido de Getúlio Vargas e de João Goulart foi entregue a grupos interessados em alianças com o poder. O PDT, partido fundado por Leonel Brizola, tansformou-se, depois da morte de Brizola, em um saco de gatos que miam por secretarias e ministérios.

     Os trabalhadores estão manietados por sindicatos alienantes; lutam apenas por salários, ouvem música country abrasileirada e tem adoração por futebol.

     O Brasil morreu ou está hibernando porque o seu povo morreu – ou está hibernando em estado de ficção.

     Mas a herança de Getúlio Vargas está intocada, simples, realizável. Talvez à espera de uma nova geração de verdadeiros brasileiros.

     Na madrugada de 24 de agosto de 1954, Getúlio Vargas suicidava-se, depois de uma última reunião com o seu ministério. Naquela ocasião, abandonado por todos, depois de Tancredo Neves aconselhar a renúncia, disse que só morto sairia do Palácio do Catete. Assinou a carta que, mais tarde, seria apelidada de carta-testamento, retirou-se para o seu quarto e deu um tiro no coração. No último parágrafo da carta está escrito:

     “E aos que pensam que me derrotaram respondo com a minha vitória. Era escravo do povo e hoje me liberto para a vida eterna. Mas esse povo de quem fui escravo não mais será escravo de ninguém. Meu sacrifício ficará para sempre em sua alma e meu sangue será o preço do seu resgate. Lutei contra a espoliação do Brasil. Lutei contra a espoliação do povo. Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia não abateram meu ânimo. Eu vos dei a minha vida. Agora vos ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na História." (Rio de Janeiro, 23/08/54 - Getúlio Vargas).

Um comentário:

  1. Excelente e emocionante matéria sobre Getulio Vargas, a quem vim a admirar com o correr dos anos. Informações relevantes sobre a trajetória do Brasil à época e à atualidade. Parabéns!

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