segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

O CONSOLO DO PROFETA


Abdul-Haqq, o Servo da Verdade, encontrou-se com Faruq, que sabia distinguir a verdade da falsidade e por isso era chamado de Profeta. Naquele dia, Abdul estava triste, porque ouvira sua mulher chorar escondida, e dirigiu-se para o porto de sua cidade, porque ficara sabendo que o Profeta estava de partida e uma multidão o cercava fazendo perguntas e pedindo consolo. Esperou pacientemente e quando chegou a sua vez, perguntou ao Profeta: 

   - Onde eu posso conseguir comida, ó servo de Deus?

    - Por favor, Abdul-Haqq, essa não é uma pergunta metafísica, respondeu o Profeta. 

    - Mesmo assim, luminar da virtude, indicai-me um caminho para saciar a fome da minha família. 

    - O caminho é o trabalho, Abdul. Trabalhai, trabalhai e, ao fim do mês recebereis a recompensa pelo vosso trabalho. 

    - Perdoai-me, magnífico servo da Verdade, mas a minha fome e a de minha família não pode esperar até o final do mês e, além disso, muita é a procura por trabalho e pouca a oferta. Por isso estou desempregado, minha mulher chora, os meus filhos adoecem e a minha fraca voz ainda ousa perguntar mais uma vez: - Como posso mitigar a fome da minha família, se estou desempregado? 

    - Enquanto não conseguis trabalho, Abdul-Haqq, deveis pedir a ajuda de pessoas importantes, como Fakhir, o cantor do Rei. 

    - Dizei-me ainda uma vez, venerado Profeta: - Fakhir, o cantor do Rei, não é aquele que desistiu de defender os pobres e oprimidos, depois que ajudou o Rei a conquistar o trono com as suas canções a favor dos pobres e oprimidos? 

    - Fakhir não desistiu, ó Abdul-Haqq, Servo da Verdade. Ele sempre lembra dos fracos e oprimidos em suas orações, mas agora ele exerce um cargo importante junto ao divã do Rei, que é o de fazer canções elogiando o seu reinado. 

    - Nesse caso, ó estimado de Deus, como posso pedir a Fakhir o que ele desconhece ou faz questão de lembrar somente em suas orações? Dizei-me quem é agora o cantor que defende os fracos e oprimidos, os que tem fome e sede de justiça, os que choram escondidos – porque será a quem pedirei ajuda. 

    - Sinto muito Abdul-Haqq, mas este é um tempo em que os cantores fazem fila para cantar os louvores do Rei, a sua glória e majestade. Não conheço nenhum que cante a favor dos pobres e oprimidos. Deveis dirigir-vos ao próprio Rei Farid para implorar ajuda e proteção. 

    - Dizei-me ainda, ó poderoso Profeta Faruq, o Rei Farid não é aquele que pediu a ajuda do povo para conquistar o reino, prometendo pão para todos? 

    - Sim, Abdul-Haqq. O Rei Farid é nobre e misericordioso, mas em nome da verdade sou obrigado a dizer-vos que o pão que ele prometeu é dividido entre os seus ministros e auxiliares, mas ele pensa muito no povo pobre e oprimido e reza por ele. 

    - Pela última vez, ó iluminado Profeta, dizei-me se não há um outro pretendente ao trono que prometa pão para o povo a quem eu possa recorrer neste momento de extrema necessidade.

    - Infelizmente, se existe eu não conheço, ó Abdul-Haqq, Servo da Verdade. Mas deveis recorrer às esferas celestes, rezando fervorosamente para que um Anjo venha auxiliá-lo.

    Naquele noite, depois de muito rezar, Abdul-Haqq e sua família receberam a visita do Anjo Azrael, que os acolheu com as suas asas negras e os levou para a eternidade da bênção de Deus.

2 comentários:

  1. Sensacional. Descreve a história do mundo atual. Talvez uma crítica aos opositores ao bolsa família. Enfim, muito bem escrito.

    Costa

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  2. Interessante conto! É a nossa história terrena, sem tirar nem por. A demagogia dos governantes e seus asseclas vai por aí. Repetida exaustivamente.
    Lidia.

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