segunda-feira, 14 de março de 2011

LÍBIA


A idéia era tomar a Tunísia, o Egito e desencadear uma guerra total contra a Líbia de Kadhafi através da mesma estratégia utilizada nos outros dois países da África do Norte: a internet e os meios de comunicação ocidentais, como BBC, CNN, Reuters e suas afiliadas nos países dependentes e colonizados mentalmente.

     A internet seria usada para “comunicar” ao povo líbio que eles viviam em uma ditadura a mais de 40 anos e que deveriam adotar o modelo democrático ocidental. Para isso, deveriam sair às ruas e protestar, gritar, fazer grandes manifestações até que, no momento estipulado – como em Jericó, segundo a lenda judaica – o governo cairia por não agüentar tantos gritos. Afinal era assim que tinha acontecido na Tunísia e no Egito e não haveria motivo para que não fosse assim também na Líbia.

     Exceto o fato de que os governos da Tunísia e do Egito sempre foram aliados dos Estados Unidos e participaram da farsa da mudança de governo, enquanto o regime de Kadhafi sempre foi um grande problema para as “democracias” ocidentais.

     Há mais de 40 anos, Kadhafi e o povo líbio fizeram uma revolução, que se caracterizou por ser islâmica, nacionalista e socialista. A idéia era fazer com que a Líbia voltasse a ser dos líbios, com um regime centralizado que dividisse a riqueza do país para o povo e tendo como força de união a religião islâmica.

     A Líbia não pertencia ao seu povo desde o início da sua história, que foi sempre marcada por tentativas de invasão, guerras civis e colonialismo. Em 1952, o emir Sayyid Idris al-Sanusi, foi coroado rei com o nome de Idris I (1951-1969). Logo após a sua coroação começou o processo de entrega das riquezas do país ao estrangeiro.

     Depois de sua admissão na Liga Árabe, em 1953, a Líbia firmou acordos para a implantação de bases estrangeiras em seu território. Em 1954, houve a concessão de bases militares e aéreas aos norte-americanos. A influência econômica dos Estados Unidos e do Reino Unido, autorizados a manter tropas no país, tornou-se cada vez mais poderosa. A descoberta de jazidas de petróleo em 1959 constituiu no fator decisivo para que o governo líbio exigisse a retirada das forças estrangeiras, o que provocou graves conflitos políticos com aquelas duas potências e com o Egito. Em 1961 teve início a exploração do petróleo por empresas estrangeiras.

     Em 1969, um grupo de oficiais liderados por Moammar al-Kadhafi derrubou a monarquia entreguista e criou a República Árabe e Popular da Líbia. O Conselho Revolucionário expulsou os efetivos militares estrangeiros e decretou a nacionalização das empresas, dos bancos e dos recursos petrolíferos, o que fez com que o país se desenvolvesse rapidamente.

     Atualmente, é o país com maior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) da África. Supera em muito o IDH do Brasil, por exemplo. O sistema político é completamente diferente dos demais países, mesmo os países socialistas tradicionais.

     Consiste de uma “Jamahiriya” – ou “Estado de Massas”. O país é governado por um Comitê Geral do Povo, chefiado por um Secretário (equivalente a um Primeiro Ministro) e integrado por secretarias. O atual Secretário é Shukri Muhammad Ghanim. O poder legislativo incumbe ao Congresso Geral do Povo, que se compõe de representantes escolhidos pelos 1.500 “mahallats”, organismos de governo local, equivalentes a prefeituras, com orçamento e poder executivo e legislativo próprios. O sistema judiciário, baseado no Corão, tem sua instância máxima na Corte Suprema. Em 1988, os Tribunais Revolucionários foram substituídos por “Bureaus Populares”.

     Kadhafi é o líder da revolução islâmica na Líbia. Seu posto é o de Coronel e representa o país como se fosse o Presidente. Para os Estados Unidos e demais países europeus e aliados, o sistema político da Líbia corresponde a um regime socialista semelhante ao de Cuba, desafiando abertamente as “democracias” capitalistas que primam pela desigualdade social.

     Assim como em 1961 os Estados Unidos tentaram invadir Cuba através da Baía dos Porcos e foram derrotados e humilhados, desde a instalação do regime de Kadhafi na Líbia – e principalmente depois que o novo governo passou a apoiar os palestinos e os povos islâmicos contra o imperialismo de Israel na região – os Estados Unidos fizeram de tudo para derrubar o regime.

     Primeiro, proibiram a importação de petróleo da Líbia. Em 1986, lançaram ataques aéreos contra Trípoli e Benghazi, provocando a morte de 130 pessoas, entre elas uma neta adotiva da Kadhafi. Em 1992 inventaram desculpas para a imposição de um regime de sanções contra a Líbia, o que resultou em um embargo econômico e a queda da economia, com o objetivo de provocar descontentamento popular. Em 1993, a CIA infiltrou-se no Exército da Líbia e patrocinou um golpe de altos oficiais contra o governo, que foi prontamente debelado com a prisão de mais de 1500 pessoas e completa reestruturação da cúpula militar.

     Mas nada disso adiantou. A partir de 1999 a economia da Líbia começou a crescer verticalmente com um aumento crescente do PIB anual e uma melhora ainda mais significativa das condições de vida do povo.

     Uma das razões desse crescimento deveu-se à abertura da economia ao Ocidente, permitindo a exploração de parte do petróleo por empresas estrangeiras, mas reservando sempre a autonomia do Estado sobre quaisquer questões econômicas. Com as maiores reservas de gás e de petróleo da África, a líbia fornece o seu produto principal a toda a Europa.

     Até agora. O capitalismo não aceita o socialismo, mas não aceita, principalmente, um país socialista que seja, ao mesmo tempo, nacionalista – porque isso faz com que o povo se una em torno de um projeto comum, evitando ao máximo as dissensões internas. E principalmente não aceita o islamismo, que, apesar das eternas divergências entre sunitas e xiitas – ortodoxos e heterodoxos – faz com que o mundo árabe encontre na religião inextinguíveis traços de união.

     Por isso resolveram destruir a Líbia e torná-la, novamente, uma colônia do Ocidente. Além disso, existe o gás e o petróleo e conquistar a Líbia implica em dominar imensuráveis reservas desses produtos.

     Para convencer o povo de que estão agindo por uma questão moral – derrubar um ditador – usam a internet e os seus tradicionais meios de comunicação. Pensam que sendo esta uma nova geração, que não participou da luta de seus pais pela libertação da Líbia, os jovens podem ser facilmente influenciados.

     Além disso, contrataram mercenários, enviaram uniformes, armas e munições, através da fronteira do Egito, para Bengazi, subverteram a população através de alguns oficiais traidores, levantaram a bandeira da antiga monarquia entreguista e preparam-se agora – caso nada disso dê certo – para uma invasão direta.

     Só não contavam com a reação fulminante de Kadhafi e do povo líbio. Mesmo assim, talvez desta vez consigam, mas estarão fabricando um novo Vietnã.

     Além disso, a mesma estratégia que estão usando para tentar conquistar a Líbia e abrir um corredor através da África do Norte em direção ao Oriente Médio, está sendo usada pelos povos de países aliados do Ocidente, como o Bahrein e a Arábia Saudita. Isso os deixa atônitos. E se o tiro sair pela culatra?

     Mesmo assim, vão insistir, porque sabem que são mais fortes militarmente e tem a imprensa ao seu lado para justificar todo o tipo de barbárie que efetuarem. Estão raivosos e a cada discurso contra a Líbia, além de vituperarem Kadhafi, acrescentam: “Delenda Cartago!”.

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"Delenda Cartago! (Destrua Cartago!) - frase usada por Catão, o Velho, ao final dos seus discursos contra Cartago no Senado romano. Cartago ficava na África do Norte.

Um comentário:

  1. É... Para quem vem acompanhando os noticiários da imprensa ocidental, e tem um mínimo de consciência, a matéria aí está com finalidade esclarecedora. Parabéns pela análise!
    Lidia.

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